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Edição Nº 19 - Uneb

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Narcimária Correia do Patrocínio Luz<br />

organismo- no sangue, na respiração, nos padrões<br />

físicos de cérebro (...) um meio de transmitir<br />

nossa experiência de modo tão poderoso que<br />

a experiência pode ser literalmente vivida por<br />

outros. (SODRÉ, <strong>19</strong>79, p.24).<br />

Pode-se citar outro exemplo interessante:<br />

avalia-se se a roupa está boa, funcional, expressando<br />

os símbolos, permitindo o desenvolver dos<br />

gestos, a dimensão de beleza na composição<br />

dos diversos elementos (já que há uma técnica),<br />

cores, símbolos que têm a sua conceituação,<br />

as características das simbologias que estão<br />

sendo expressas. Exige-se boa performance<br />

técnica, em meio à criação, uma criatividade<br />

sobre uma linguagem estética.<br />

Aqui, saber e fazer constituem uma coisa só.<br />

Os códigos em Odara são sedutores, significativos<br />

para a formação da identidade cultural.<br />

Assim, por que não pensarmos uma linguagem<br />

pedagógica que se nutra da noção de<br />

Odara?<br />

A Mini Comunidade Oba Biyi 9 , primeira experiência<br />

de educação pluricultural no Brasil,<br />

inseriu na sua linguagem pedagógica a categoria<br />

Odara. Com isso, as crianças ficaram mais<br />

seduzidas a participar das atividades curriculares,<br />

pois se envolviam com a riqueza da dimensão<br />

estética Nagô própria da sua territorialidade.<br />

Fazia-se um apelo aos sentidos durante o<br />

tempo todo, incitando os participantes a aderir<br />

às situações apresentadas nesta comunidade.<br />

Não havia, como elemento centralizador, a<br />

criança trancada na sala de aula, inerte numa<br />

carteira, lidando com os elementos técnicos<br />

e/ou aparatos da escrita que, em nosso entendimento,<br />

são pobres no que tange às sensações<br />

que envolvem o corpo humano, pois nesse contexto<br />

da escrita apela-se, incessantemente, para<br />

a visão e o cérebro, em detrimento do tato, paladar<br />

e olfato, como é a onipotência edipiana da<br />

educação.<br />

A culinária também é um outro exemplo<br />

muito significativo para contextualizarmos a<br />

noção de Odara, principalmente porque há o<br />

pronunciamento de uma complexa combinação<br />

de repertórios de símbolos, sentidos e sensações.<br />

Aqui, encontramos elementos técnicos que<br />

se revelam no fazer, no atender às regras litúrgicas,<br />

à iniciação específica para poder manusear<br />

as oferendas, até que sejam constituídos os alimentos,<br />

cuja feição, correspondente às características<br />

simbólicas de uma estética própria,<br />

mobiliza os sentidos do olfato, paladar, tato, visão<br />

e audição.<br />

Essa totalidade de sentidos expressa odor,<br />

sabor, textura, forma, cor das substâncias que<br />

caracterizam axé 10 , promovendo conhecimento<br />

das qualidades constituintes das forças que<br />

representam cada entidade ou Orixá. Essas<br />

entidades ou Orixá têm seu alimento preferido,<br />

ou seja, as qualidades dos poderes correspondentes<br />

de seu axé.<br />

Assim, há uma profunda classificação de<br />

substância – signos culinários que detêm combinações<br />

pertinentes, formas e modo de preparo<br />

que constituem a ciência da culinária litúrgica.<br />

A culinária litúrgica é muito importante na<br />

circulação, introjeção de axé e na aprendizagem<br />

de conhecimentos no contexto da tradição<br />

africana. Mãe Aninha, a Iyá Oba Biyi, no II<br />

Congresso Afro-Brasileiro em <strong>19</strong>37, realizado<br />

em Salvador, escolheu como tema de sua comunicação<br />

a ciência da culinária litúrgica, afirmando<br />

desta forma a linguagem da tradição no<br />

âmbito acadêmico oficial.<br />

Por meio da culinária litúrgica também se<br />

realiza o re-ligare, que permite o compartilhar<br />

coletivamente conhecimentos e modos de sociabilidade,<br />

que potencializam a existência comunitária.<br />

Como os contos míticos fazem parte da dimensão<br />

estética Nagô e são plenos de Odara,<br />

vamos explorar um pouco a importância dos<br />

mitos na composição de perspectivas educacionais<br />

no âmbito das comunalidades africanas.<br />

Mestre Didi, apresenta narrativas míticas<br />

pelas quais aprendemos a sentir, perceber, valorizar<br />

e incorporar, em função de uma proposição<br />

de linguagem pedagógica.<br />

9<br />

Projeto piloto de Educação Pluricultural, idealizado e<br />

realizado pela Sociedade de Estudos das Culturas e da<br />

Cultura Negra no Brasil-SECNEB, no período de <strong>19</strong>76 a<br />

<strong>19</strong>86, na comunidade-terreiro Ilê Axé Opô Afonjá.<br />

10<br />

Axé, força invisível, mágico-sagrada de toda divindade,<br />

expressa a força vital que assegura a existência, permite o<br />

acontecer e o devir. Como toda a força, o axé é transmitido<br />

e conduzido por meios materiais simbólicos e<br />

acumuláveis.<br />

Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 61-80, jan./jun., 2003<br />

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