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Anais DCIMA Final

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Página 194<br />

como se estivesse à beira de um abismo, e temesse tombar na voragem. Olhos<br />

abertos, piscando, Paulo Fernando ouvia, em torno, ordens em alemão, tinir de<br />

ferros dentro de uma lata, jorro d'água, e passos pesados ou ligeiros, de<br />

desconhecidos. Esses rumores eram, no seu espírito, causa de novas reflexões.<br />

[...]. Compreendia a inocuidade da esperança e a inutilidade da queixa.<br />

Levantou-se, assim, tateando, e, pela mão do médico, subiu na mesa de ferro<br />

branco, deitou-se ao longo, deixou que lhe pusessem a máscara para o<br />

clorofórmio, sentiu que ia ficando leve, aéreo, imponderável. E nada mais soube<br />

nem viu. (CAMPOS, Humberto de., 1954, p.46)<br />

Porém, o clímax do conto acontece quando se retira as ataduras dos olhos de Paulo. Segundo essa<br />

perspectiva, cria-se outra tensão acerca do resultado final da cirurgia, se o personagem consegue ou não<br />

recuperar a visão. Todo o contexto narrativo gira em torno da expectativa realizada de outros personagens<br />

acerca do momento decisivo da trama. A descrição dos eventos na narrativa se dá de forma decrescente, dando<br />

uma impressão de velocidade que vai desacelerando até o clímax da retirada das vendas de Paulo.<br />

Chega um dos momentos finais do conto de forma, além da hesitação, percebe-se também a presença<br />

do horror no conto pelo efeito colateral, podendo assustar o leitor. Como narra Humberto de Campos<br />

(CAMPOS, Humberto de., 1954, p.46) em:<br />

O operado, olhos abertos, olha em torno. Olha e, em silêncio, muito pálido, vai<br />

se pondo de pé. A pupila entra em contacto com a luz, e ele enxerga, distingue,<br />

vê. Mas é espantoso o que vê. Vê, em redor, criaturas humanas. Mas essas<br />

criaturas não têm vestimentas, não têm carne; são esqueletos apenas; são ossos<br />

que se movem, tíbias que andam, caveiras que abrem e fecham as mandíbulas!<br />

Os seus olhos comem a carne dos vivos. A sua retina, como os raios-X, atravessa<br />

o corpo humano e só se detém na ossatura dos que a cercam, e diante das cousas<br />

inanimadas! O médico, à sua frente, é um esqueleto que tem uma tesoura na<br />

mão! Outros esqueletos andam, giram, afastam-se, aproximam-se, como um<br />

bailado macabro! (CAMPOS, Humberto de., 1954, p.46)<br />

O horror, presente na narrativa, segundo H. P. Lovecraft 22 (LOVERCRAFT, 1973, P. 12) afirma é<br />

filho do século dezoito. E ele já abre a introdução do seu livro falando acerca disso:<br />

A emoção mais antiga e mais forte da humanidade é o medo, e o tipo de medo<br />

mais antigo e mais poderoso é o medo do desconhecido. Poucos psicólogos<br />

contestarão esses fatos e sua reconhecida verdade deve estabelecer, para todos<br />

os tempos, a autenticidade e dignidade da ficção fantástica de horror como forma<br />

22<br />

Howard Phillips Lovecraft nasceu no dia 20 de Agosto de 1890, e era escritor estadunidense que revolucionou o gênero<br />

de terror, atribuindo-lhe elementos fantásticos que são típicos dos gêneros de fantasia e ficção científica.<br />

Universidade Federal do Maranhão – Cidade Universitária Dom Delgado<br />

Avenida dos Portugueses, 1.966 - São Luís - MA - CEP: 65080-805

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