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01-Contra Capa Vol 29 nº 49 - Senado Federal

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6<br />

ANAIS DO SENADO FEDERAL<br />

OUTUBRO 2005<br />

37022 Quinta-feira 27 DIÁRIO DO SENADO FEDERAL Outubro de 2005<br />

tanta gente, para que nos encontremos com a nossa<br />

própria história.<br />

É em homenagem ao Vlado que eu gostaria<br />

de reiterar a importância de sabermos exatamente<br />

tudo o que ocorreu naquele período. É um direito<br />

dos familiares daqueles que foram perseguidos saber<br />

a história completa. É importante que o Presidente<br />

Lula esteja atento a este anseio de todos nós<br />

brasileiros.<br />

A morte de Vlado nos fez chorar e até hoje incomoda.<br />

Como disse Frei Betto em seu artigo tão belo,<br />

publicado na segunda-feira, “Herzog, memória subversiva”,<br />

citando Santo Tomás de Aquino, a tortura é crime<br />

maior que o homicídio. E ainda ele, o frade dominicano<br />

que lutou contra a ditadura e diz sempre não querer<br />

para seus torturadores o que lhe fizeram na prisão,<br />

lembra Isaías, que afirmou, 2.800 anos atrás, que “só<br />

haverá paz na humanidade como fruto da Justiça”. É<br />

isto que o Vlado, morto subversivo, e todos os outros<br />

perseguidos representam: o nosso sofrido caminho<br />

para a realização da Justiça e, como conseqüência,<br />

a verdadeira paz.<br />

Conheci Vlado quando eu estava entrando na revista<br />

Visão e ele saindo de lá, sendo substituído por<br />

Rodolfo Konder. E ali interagimos um pouco. Foi então<br />

que ele seguiu para a TV Cultura.<br />

José Mindlin, que era o Secretário de Ciência e<br />

Tecnologia do Governador Paulo Egídio, avaliou que<br />

Vlado era uma pessoa extremamente competente e<br />

que poderia estar à frente do jornalismo da TV Cultura,<br />

ao lado de Fernando Pacheco Jordão. Ali, ambos<br />

iniciaram o telejornal Hora da Notícia. Estavam<br />

não apenas Vlado, como editor, e João Batista de<br />

Andrade, atual Secretário de Cultura do Estado de<br />

São Paulo. Eles montaram uma redação com pessoas<br />

como Rose Nogueira, que hoje me ajudou a<br />

recordar estes fatos.<br />

Vlado, que nasceu na antiga Iugoslávia e desde<br />

pequeno soube o que era perseguição, porque seus<br />

próprios pais haviam sido perseguidos em função de<br />

sua família ser judia, e tiveram de fugir, eles todos, da<br />

perseguição do nazismo, tinha um verdadeiro amor<br />

pela liberdade e detestava todo e qualquer tipo de tortura.<br />

Na redação do jornal Hora da Notícia, ele tantas<br />

vezes teve que enfrentar a censura, que impedia, por<br />

exemplo, noticiar-se qualquer coisa sobre D. Hélder<br />

Câmara, ou seja, o Arcebispo de Recife e Olinda não<br />

poderia ser citado.<br />

A palavra “crise” era proibida; para substituí-la<br />

escreviam, por exemplo, “questão”, “problema”, inventavam<br />

um sinônimo. Todas as proibições de censura<br />

que chegavam por telex eram pregadas ali na parede<br />

coberta por esses telegramas e que ficou na memória<br />

de toda aquela equipe de jornalistas.<br />

Pois bem. No dia 24 de outubro, trinta anos<br />

atrás exatamente, depois de ter sido procurado em<br />

casa pela polícia, Vlado, ele próprio, resolveu se<br />

apresentar na manhã seguinte nas dependências<br />

do DOI-CODI.<br />

Fernando Pacheco Jordão, no livro Dossiê Herzog<br />

– que recomendo assim como o livro que está<br />

sendo lançado de Paulo Markun –, relata como os<br />

próprios diretores da TV Cultura, tendo sabido do<br />

fato, foram, cerca de cinco, seis pessoas, à casa de<br />

Clarice, a mulher de Vlado, dizer a ela o que tinha<br />

ocorrido, pois tinham tido a comunicação de que Vlado<br />

morrera, mas não conseguiam dizer a ela a circunstância<br />

em que teria ocorrido. E eis que ela, na sua<br />

intuição, percebeu o que havia ocorrido e disse com<br />

toda a sua força para eles: “Mataram o Vlado. Eles<br />

mataram o Vlado que não tinha nada, não fez nada.<br />

Eles mataram o Vlado”.<br />

Srª Presidente, que esse grito de Clarice Herzog,<br />

que ecoa com tanta força até hoje, que está<br />

sendo ouvido por todos esses anos, seja o grito<br />

de amor à liberdade, o amor à democracia, para<br />

que nunca mais crimes contra a pessoa ocorram<br />

no Brasil, seja contra jornalistas brilhantes, como<br />

Vlado Herzog, seja contra toda e qualquer pessoa,<br />

seja contra missionários, como a Irmã Doroty Stang,<br />

seja contra moradores de ruas ou mendigos, como<br />

aqueles que recentemente foram mortos nas ruas<br />

do Rio de Janeiro e de São Paulo, seja contra aqueles<br />

que estejam nesta hora em celas superlotadas<br />

do sistema penitenciário brasileiro, que infelizmente<br />

ainda sofrem maus-tratos como aqueles infringidos<br />

a Vlado Herzog, morto pelos maus-tratos dos que<br />

eram responsáveis pela sua pessoa.<br />

Srª Presidente, que a luz de Vlado Herzog esteja<br />

sempre iluminando os amantes da realização da justiça,<br />

da liberdade e da democracia.<br />

Muito obrigado.<br />

DOCUMENTO A QUE SE REFERE DO<br />

SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU<br />

PRONUNCIAMENTO.<br />

(Inserido nos termos do art. 210, inciso<br />

I e § 2º, do Regimento Interno.)

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