06.05.2013 Views

A doenca como linguagem da alma.pdf

A doenca como linguagem da alma.pdf

A doenca como linguagem da alma.pdf

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

fatiga<strong>da</strong> e cega seus olhos ca<strong>da</strong> vez mais fracos. Assombrar desde o<br />

esconderijo e tecer fios invisíveis, cuspir na sopa dos que estão no primeiro<br />

plano <strong>como</strong> eminência par<strong>da</strong>, este é seu ofício. "O traste velho deve <strong>da</strong>r<br />

solavancos e fazer barulho, no ático e no porão. Ele deve rumorejar e<br />

assombrar. Sua hora propicia é a hora dos espíritos.. " 87 .<br />

O que é válido para a socie<strong>da</strong>de, naturalmente afeta também o indivíduo<br />

idoso. A época grisalha é sua chance de confrontar-se com o escuro, o<br />

horrível de sua vi<strong>da</strong>, fazer a arrumação dos fantasmas que foram se<br />

acumulando.<br />

Juntamente com isso, há também uma participação substancial do<br />

elemento "doidice". O que o velho louco faz é totalmente incompreensível<br />

para os contemporâneos de orientação mun<strong>da</strong>na, porque ele já vê as coisas<br />

de uma outra perspectiva. No tarô, o louco é o grau mais elevado. O fato de<br />

que justamente ele seja classificado por algumas escolas de tarô <strong>como</strong><br />

sendo o primeiro símbolo, inferior, mostra a grande confusão que no<br />

entretempo se formou em relação a esse arquétipo. O papel clássico do<br />

louco e <strong>da</strong> oportuni<strong>da</strong>de conti<strong>da</strong> nessa fase pode ser visto na imagem do<br />

bobo <strong>da</strong> corte. O bobo <strong>da</strong> corte era o único que podia dizer a ver<strong>da</strong>de sem<br />

disfarces ao governante sem ter de responder por isso. Estando fora <strong>da</strong><br />

jurisdição normal, ele já não podia mais ser culpado. Seu maior crime era ser<br />

chato.<br />

Mostra-se aqui <strong>como</strong> esse arquétipo está desamparado hoje em dia.<br />

Temos uma profusão de políticos envelhecidos que se aferram ao poder e<br />

que chegam até mesmo a levá-lo para a tumba. Os aduladores <strong>da</strong> corte de<br />

épocas anteriores foram substituídos por hor<strong>da</strong>s envelheci<strong>da</strong>s de<br />

funcionários públicos que, cinzentos e mesquinhos, deficientemente<br />

representam as belas e frescas cortesãs de outros tempos e somente<br />

conservam florescente o padrão do lacaio. Os velhos loucos, que podem se<br />

permitir dizer simplesmente a ver<strong>da</strong>de e isso, ain<strong>da</strong> por cima, de forma<br />

irônica, nos fazem falta. O que não <strong>da</strong>ríamos por um velho político que, <strong>como</strong><br />

bobo <strong>da</strong> corte e admoestador que não tem mais na<strong>da</strong> a perder e, por isso<br />

mesmo, tem tudo a ganhar, escreve a ver<strong>da</strong>de nua e crua no livro de visitas<br />

<strong>da</strong> solícita camarilha de provocadores.<br />

O velho louco, que finalmente pode dizer o que sempre quis ser<br />

declarado, seria em conseqüência uma solução do tema <strong>da</strong> velhice. De uma<br />

maneira mais direta, mais irônica e até mesmo mais obscena, ele poderia<br />

obter ar para si mesmo. Caso até então ele guar<strong>da</strong>sse no coração algum<br />

378

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!