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digital - Comunidade Virtual de Antropologia

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Esse obscuro objeto da pesquisa<br />

espião e a do pesquisador que quer se tornar invisível por sua<br />

primorosa adaptação ao médio (índio entre os índios, pescador entre os<br />

pescadores). O pesquisador, na verda<strong>de</strong>, está bem visível ai no palco,<br />

não necessariamente no seu centro. E mais vale contar com isso. O<br />

pesquisador nunca contempla um campo em si, mas um campo-compesquisador,<br />

e um campo-para-o-pesquisador. Isso significa<br />

simplesmente que o pesquisador não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser social, e que o<br />

fruto do seu trabalho está composto precisamente das suas interações<br />

em campo. E dai que seu trabalho não consiste em eludir as distorções<br />

provocadas pela sua presença, mas precisamente focá-las e anotá-las. O<br />

pesquisador <strong>de</strong> campo <strong>de</strong>ve tirar partido das diferenças entre o campo<br />

e o laboratório, e não imaginar um laboratório no campo. A isso se<br />

reduz, em síntese, a observação participante.<br />

O centro do palco<br />

Po<strong>de</strong> se ce<strong>de</strong>r aos atrativos do trocadilho, renunciar à observação<br />

participante e preferir a participação observante. Mas é bom notar que<br />

esse trocadilho não se limita, como po<strong>de</strong>mos pensar, a acrescentar<br />

valor ético a uma técnica datada da época do colonialismo:<br />

- Ô, rapaz, eu não estou aqui observado os caras como se fossem<br />

animais num zoológico, eu vim aqui a por a mão na massa também.<br />

Refere-se na verda<strong>de</strong> a algo diferente, na medida em que repousa<br />

na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transladar o laboratório para o campo. É o que<br />

acontece, <strong>de</strong> modo típico, nos ensaios <strong>de</strong> pesquisa-ação (em tempo: a<br />

pesquisa-ação, conhecida como uma proposta <strong>de</strong> esquerda com esse<br />

rótulo, po<strong>de</strong> ser reaparecer em projetos <strong>de</strong> orientação política muito<br />

diferente sem esse rótulo). Em lugar <strong>de</strong>ssa presença liberal <strong>de</strong> um<br />

pesquisador que através <strong>de</strong> uma interação o mais comum que possível<br />

reúna suas reflexões sobre o outro, vamos introduzir uma ação positiva<br />

que altere a situação <strong>de</strong> campo (um projeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />

sustentável ou <strong>de</strong> re-etnizacao, por exemplo) e a partir dai<br />

observaremos as re<strong>de</strong>s nativas em ação, não mais <strong>de</strong>s<strong>de</strong> um discreto<br />

segundo plano, mas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o centro do palco. Exorcizam-se assim as<br />

pretensões <strong>de</strong> invisibilida<strong>de</strong> e neutralida<strong>de</strong> do pesquisador, e<br />

acrescenta-se um valor moral à pesquisa. Há um problema<br />

epistemológico nessa proposta, na medida em que ela também<br />

translada, em certa medida, o laboratório ao campo: anota as respostas<br />

que os nativos dão a certa questão, ou a uma experiência, introduzida<br />

pelo pesquisador, quem com o seu projeto leva ao campo também toda<br />

uma parafernália econômica, política e legal <strong>de</strong>ntro da qual os nativos<br />

terão que procurar seu lugar. Em qualquer caso, e antes <strong>de</strong> que esse<br />

problema epistemológico se converta por sua vez em problema ético, é<br />

bom lembrar que ocupar o centro do palco é algo que não <strong>de</strong>veria se<br />

fazer sem uma vonta<strong>de</strong> muito explícita dos donos originais do palco.<br />

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