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digital - Comunidade Virtual de Antropologia

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Esse obscuro objeto da pesquisa<br />

Embora a persistente fama <strong>de</strong> Wittgenstein tenha associado ao seu<br />

nome a idéia, ela foi na verda<strong>de</strong> muito mais <strong>de</strong>senvolvida por vários<br />

filósofos <strong>de</strong> Oxford, cuja obra é às vezes reunida sob o rótulo <strong>de</strong><br />

ordinary language philosophy. “Ordinary language”, um breve escrito<br />

<strong>de</strong> Gilbert Ryle –<strong>de</strong> quem também proce<strong>de</strong> a noção <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong>nsa,<br />

que trataremos mais tar<strong>de</strong>- sintetiza os seus princípios.<br />

É claro que <strong>de</strong>vemos levar em consi<strong>de</strong>ração em primeiro lugar essa<br />

dúvida que Ryle admite a respeito da noção <strong>de</strong> linguagem comum. A<br />

linguagem comum <strong>de</strong> quem? Dos eruditos? Dos meios <strong>de</strong><br />

comunicação? Dos cidadãos iletrados? É claro que não po<strong>de</strong> se reduzir<br />

a ciência à divulgação da ciência, e é corriqueiro que ela se afaste da<br />

linguagem comum por razões <strong>de</strong> economia, ou, para dize-lo <strong>de</strong> um<br />

outro modo, porque a ciência, seja lá qual for, vive a criar objetos<br />

inusitados, entenda-se, no caso, objetos verbais inusitados.<br />

Mas se os limites da linguagem comum são dúbios, o seu sentido<br />

não o é. Na medida do possível, os nossos textos não <strong>de</strong>veriam<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> um glossário. Seja lá qual for a especialização da<br />

linguagem em que é enunciado o nosso saber, o postulado da<br />

linguagem comum indica que esse saber <strong>de</strong>ve ser pelo menos<br />

suscetível <strong>de</strong> ser traduzido a uma linguagem mais e mais comum. A<br />

pergunta “e o quê isso quer dizer?” <strong>de</strong>ve ser sempre passível <strong>de</strong><br />

resposta, mesmo que o seja com <strong>de</strong>scrições mais <strong>de</strong>moradas que as que<br />

permitiria uma linguagem especializada. E isso <strong>de</strong>ve acontecer sem<br />

que se perda no caminho o seu conteúdo.<br />

Ryle admite que em <strong>de</strong>terminados casos (ele fala em filosofia,<br />

talvez nós po<strong>de</strong>ríamos dizer: em <strong>de</strong>terminadas ciências) isso po<strong>de</strong> não<br />

ser possível. É conhecida aquela anedota <strong>de</strong> Einstein que tentava<br />

explicar a teoria da relativida<strong>de</strong> a um interlocutor, usando termos um<br />

comparações cada vez mais comuns. O interlocutor não entendia, até<br />

que numa <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>ira tentativa exclamou: “Mas é! Isso aí já consegui<br />

enten<strong>de</strong>r” Einstein respon<strong>de</strong>u “Mas isso aí já não é mais a teoria da<br />

relativida<strong>de</strong>”.<br />

Nesses casos, voltando a Ryle, a alternativa é uma linguagem<br />

formalizada, plenamente formalizada: a matemática, por exemplo.<br />

Uma proposição científica não po<strong>de</strong> ter como única residência esse<br />

meio campo da linguagem especializada: ou ela é capaz <strong>de</strong> alcançar a<br />

plena formalização ou ela <strong>de</strong>ve ser capaz <strong>de</strong> alcançar a linguagem<br />

comum.<br />

Nas ciências humanas, que não recorrem <strong>de</strong> praxe à linguagem<br />

formalizada, a linguagem especializada tem uma utilida<strong>de</strong> restrita. É<br />

preferível limitar seu uso ao imprescindível, e mesmo nesses casos não<br />

há conceito que não <strong>de</strong>va po<strong>de</strong>r traduzir-se em outros menos<br />

esotéricos. Como regra para qualquer pesquisador, po<strong>de</strong> se recomendar<br />

que jamais use um conceito que se sinta incapaz <strong>de</strong> traduzir a outros<br />

termos mais compreensíveis.<br />

A opção pela linguagem comum não é uma opção pelo uso castiço<br />

do idioma, mas todo o contrário. O esforço <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver novos objetos<br />

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