digital - Comunidade Virtual de Antropologia
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Esse obscuro objeto da pesquisa<br />
polêmica acirrada, nem polêmica alguma entre antropólogos, a não<br />
ser por questões digamos políticas no seio <strong>de</strong> alguma subespecialida<strong>de</strong>.<br />
Isso não quer dizer que os antropólogos cooperem solidariamente e<br />
não saibam <strong>de</strong> inimigos, mas o vazio -e um silêncio <strong>de</strong>s<strong>de</strong>nhoso- é via<br />
<strong>de</strong> regra suficiente para tratar com estes. Muito melhor que a<br />
polêmica.<br />
Quando é necessário, todas as facções teóricas ou temáticas se<br />
agrupam em boa or<strong>de</strong>m no quadro <strong>de</strong> uma associação profissional ou<br />
<strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> pós-graduação. E po<strong>de</strong> não haver protocolos <strong>de</strong><br />
pesquisa muito explícitos, nem gran<strong>de</strong>s teorias unificadas, nem<br />
critérios absolutos <strong>de</strong> avaliação, mas o sistema funciona como se não<br />
faltasse nada disso. Aparentemente, a indisciplina antropológica<br />
consegue unir a heterogeneida<strong>de</strong> da ciência econômica à paz da<br />
ciência contábil. Rebeldia? É preciso reconhecer que essa anarquia<br />
toda encontra meios <strong>de</strong> colaborar com o Estado, esse gran<strong>de</strong><br />
disciplinador, e <strong>de</strong>sempenhar junto a ele o papel <strong>de</strong> savant, <strong>de</strong> expert,<br />
<strong>de</strong> especialista. A antropologia, mesmo não sendo uma ciência normal,<br />
consegue funcionar normalmente. As disputas pela legitimida<strong>de</strong> e o<br />
po<strong>de</strong>r não se exprimem em termos teóricos, mas em termos<br />
diretamente institucionais, com a ajuda <strong>de</strong>sse sucedâneo da<br />
epistemologia que é a cultura da avaliação (um Popper suplantado por<br />
um Lattes, ou por um Datacapes). Os conceitos, <strong>de</strong>vidamente<br />
rotinizados, são aplicados à <strong>de</strong>finição e a salvaguarda <strong>de</strong> uma<br />
ortodoxia social. Certo, a antropologia é avessa as ortodoxias, e teria<br />
dificulda<strong>de</strong> em se a<strong>de</strong>quar a esse papel se não fosse porque a ortodoxia<br />
atual está feita, entre outras coisas, <strong>de</strong> uma rejeição formal das<br />
ortodoxias.<br />
Resumindo este item, é interessante que a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da<br />
antropologia esteja permanentemente em questão, ou em crise. Mas<br />
<strong>de</strong>vemos evitar que a crise seja um pretexto para um diálogo circular:<br />
“O que é a antropologia, professor?”<br />
“Bela pergunta! O que é a antropologia?”<br />
“O que é a antropologia então, professor?”<br />
“O que é a antropologia? Gran<strong>de</strong> pergunta!”<br />
Nos itens a seguir tentaremos <strong>de</strong>sdobrar essa gran<strong>de</strong> pergunta em<br />
outras perguntas apenas um pouco menores, talvez mais suscetíveis <strong>de</strong><br />
resposta.<br />
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