22.06.2015 Views

digital - Comunidade Virtual de Antropologia

digital - Comunidade Virtual de Antropologia

digital - Comunidade Virtual de Antropologia

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Oscar Calavia Sáez<br />

excessivamente metafísico do dialogo. Para isso, nada melhor que<br />

confrontar a noção comum <strong>de</strong> dialogo com o que foi dito no item<br />

anterior a respeito da metodologia <strong>de</strong> Devereux. Nela, o dialogo existe,<br />

mas não se da entre indivíduos universais mas entre sujeitos<br />

carregados <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e posição contrastiva.<br />

A idéia <strong>de</strong> dialogo po<strong>de</strong> ser enganadora na medida em que ela<br />

realça, por assim dizer, a abstração dos sujeitos. Ou seja, para dialogar,<br />

dois ou mais sujeitos tem que se reduzir a uma certa igualda<strong>de</strong>. Não<br />

importa que um <strong>de</strong>les represente um exército inteiro com cinco<br />

divisões, artilharia e outros artefatos <strong>de</strong> assédio e o outro uma cida<strong>de</strong><br />

inteira com fortificações e uma população faminta. Na hora do<br />

diálogo, há um por cada lado, e a única coisa que ambos po<strong>de</strong>m fazer é<br />

falar. Po<strong>de</strong>ria até acontecer que o representante da parte mais fraca<br />

seja pessoalmente maior e mais forte que o seu interlocutor;<br />

evi<strong>de</strong>ntemente não po<strong>de</strong>rá aproveitar a ocasião para esmaga-lo a<br />

golpes, embora possa, sim, eventualmente, aproveitar uma maior<br />

habilida<strong>de</strong> verbal. A situação <strong>de</strong> diálogo cancela, até um certo ponto,<br />

as relações previamente estabelecidas e as or<strong>de</strong>na em volta <strong>de</strong> novos<br />

eixos.<br />

Pese ao exotismo <strong>de</strong>sse exemplo bélico, a alegoria nos serve. O<br />

diálogo etnográfico cancela também, até um certo ponto, as relações<br />

previamente estabelecidas; nivela e homogeneíza até um certo ponto<br />

os interlocutores. Por assim dizer, obriga a esse conjunto amplo <strong>de</strong><br />

relações que há entre o mundo do pesquisador e o mundo do nativo a<br />

se estreitar, fazendo-o passar através <strong>de</strong> um canal muito fino que é o<br />

intercâmbio dialógico.<br />

Mas isso não <strong>de</strong>ve fazer esquecer do certo ponto: o dialogo,<br />

evi<strong>de</strong>ntemente, não abole a diferença, que se incorporará ao diálogo <strong>de</strong><br />

algum modo. Mesmo assim, seus resultados não serão idênticos aos <strong>de</strong><br />

um encontro em bruto <strong>de</strong> ambos os universos que se <strong>de</strong>ixam<br />

representar no diálogo, e por isso os resultados da diplomacia nunca<br />

são os mesmos do confronto puro e simples. Para um diplomático que<br />

dialoga, quanto mais se <strong>de</strong>sviem os resultados do diálogo dos<br />

resultados do encontro em bruto melhor terá sido o seu <strong>de</strong>sempenho.<br />

Para o pesquisador que dialoga, esse critério é muito mais<br />

escorregadio: ele, afinal, não está querendo evitar um massacre, mas<br />

tentando comunicar dois mundos, o seu e o do nativo, e a comunicação<br />

falharia se fosse interrompida pela diferença, mas também se<br />

neutralizasse a diferença. O pesquisador erraria se pensasse que a<br />

situação <strong>de</strong> dialogo abole a diferença entre os interlocutores (isso é<br />

bastante comum, já que a procura <strong>de</strong> empatia po<strong>de</strong> estar muito<br />

presente no dialogo, por uma ou por ambas partes) que, antes ou<br />

<strong>de</strong>pois, acabará se manifestando; mas po<strong>de</strong> errar, também, se a<br />

habilida<strong>de</strong> dialógica, <strong>de</strong>le ou do nativo, conduzisse a uma espécie <strong>de</strong><br />

abolição efetiva –no âmbito do dialogo- <strong>de</strong>ssa diferença.<br />

Afinal, nosso interlocutor nos interessa, e é através <strong>de</strong>le que<br />

ace<strong>de</strong>mos a essa realida<strong>de</strong> que, por convenção, ele representa. Não<br />

vamos ace<strong>de</strong>r nunca diretamente à cosmologia da tribo <strong>de</strong><br />

154

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!