digital - Comunidade Virtual de Antropologia
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Esse obscuro objeto da pesquisa<br />
Antes <strong>de</strong> mais nada<br />
O fundamento <strong>de</strong>ste manual <strong>de</strong> método é etnográfico. Isto é, parto<br />
da minha experiência <strong>de</strong> já bastantes anos como estudante e <strong>de</strong>pois<br />
professor <strong>de</strong> pós-graduação, orientador, membro <strong>de</strong> bancas, e<br />
parecerista ad hoc <strong>de</strong> projetos ou artigos. É da teoria e do método com<br />
que me <strong>de</strong>parei no meio <strong>de</strong> todas essas ativida<strong>de</strong>s que vou me ocupar<br />
aqui. Não, ou não em primeiro lugar, da teoria e do método como um<br />
conjunto <strong>de</strong> princípios, conceitos e sínteses <strong>de</strong>senvolvidos nos cento e<br />
poucos anos <strong>de</strong> existência acadêmica da antropologia, sobre os quais já<br />
muito foi dito, escrito e publicado.<br />
O roteiro geral <strong>de</strong>ste manual segue, quase sem exceção, o rastro das<br />
perguntas ou das dúvidas apresentadas por este ou aquele aluno, o dos<br />
problemas encontrados nas orientações, ou das premissas que os<br />
causavam. Alguns outros temas foram incluídos porque toda essa<br />
experiência os arrastava para <strong>de</strong>ntro do argumento. Às vezes parecerá<br />
que são questões <strong>de</strong>masiado óbvias, ou alheias ao argumento, mas, se<br />
trato <strong>de</strong>las, é porque alguma vez comprovei que, malgrado as<br />
aparências, não o são. Ou não o são para todos. Essa abordagem<br />
“etnográfica” é coerente com esse imperativo etnográfico que, como<br />
veremos mais adiante, tomou conta da nossa ativida<strong>de</strong>: e a etnografia<br />
está continuamente a focar questões que ninguém mais foca porque,<br />
supostamente, são óbvias. Se <strong>de</strong>vemos ser etnógrafos, <strong>de</strong>veríamos sê-lo<br />
também na hora <strong>de</strong> contar como se faz essa disciplina que se quer<br />
reflexiva.<br />
Trata-se <strong>de</strong> um manual, sui generis mas manual; se outros manuais<br />
são algo assim como os textos constitucionais do país da antropologia,<br />
este preten<strong>de</strong> ser algo mais parecido a um guia para viageiros –esses<br />
guias que eventualmente indicam aon<strong>de</strong> é costume pagar suborno ou<br />
quais praias maravilhosas se tornaram engarrafamentos a beira-mar.<br />
Quem lê isto já sabe que os guias são enviesados, ou o são <strong>de</strong> um<br />
modo mais franco que as constituições. Este não preten<strong>de</strong> fugir à regra.<br />
Embora pelo meu histórico pessoal eu mesmo me insira nesse<br />
paradigma ou nesse campo que vou <strong>de</strong>screver, e embora compartilhe<br />
quase todos seus critérios, seus conceitos e seus tics, estou longe <strong>de</strong><br />
ter o mesmo apreço por todos eles. Volta e meia, expresso opiniões<br />
opostas às <strong>de</strong> circulação mais geral: <strong>de</strong>sse confronto po<strong>de</strong> surgir<br />
alguma alternativa às práticas em vigor, ou pelo menos uma<br />
percepção mais nítida daquilo que na prática acadêmica já se tornou<br />
comum o bastante como para não ser explicitado.<br />
O livro é breve, e portanto a teoria e o método que aqui ofereço são<br />
também breves. Mas não entendo isso como uma limitação. Ou mais<br />
exatamente, não entendo que essa limitação seja uma falta. Pelo<br />
contrário, estou persuadido <strong>de</strong> que a dilatação teórica e metodológica<br />
são contradições nos termos. Em boa forma, não <strong>de</strong>veriam ocupar<br />
muito espaço.<br />
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