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digital - Comunidade Virtual de Antropologia

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Oscar Calavia Sáez<br />

pesquisa, e não mora em qualquer patamar diferente. Não que a<br />

presença <strong>de</strong> um indivíduo curioso possa alterar significativamente a<br />

vida do morro da Mangueira como tal -é <strong>de</strong>masiado gran<strong>de</strong> e tem<br />

gente <strong>de</strong>mais para isso-, mas porque o que o etnógrafo colhe é<br />

precisamente essa mínima porção <strong>de</strong> realida<strong>de</strong> que ele altera com sua<br />

presença e sua função <strong>de</strong> pesquisador. Ambas geram respostas,<br />

atitu<strong>de</strong>s, interpretações que não necessariamente existiriam (ou<br />

simplesmente não existiriam) sem a sua presença.<br />

Ampliando o foco, isso é a conseqüência <strong>de</strong> admitir que não há<br />

saber in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> um sujeito, ou seja, que não há saber que não<br />

seja perspectivo. A base da nossa tese não é a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal ou qual<br />

lugar, mas o conjunto dos dados que nós produzimos ao entrar em<br />

interação com essa realida<strong>de</strong>.<br />

Nota bene, isso não é em modo nenhum uma posição cética,<br />

agnóstica ou subjetivista, é apenas empirismo bem entendido. Quem<br />

suponha ser mais objetivo i<strong>de</strong>ntificando a realida<strong>de</strong> com os dados<br />

claros e firmes que ele obteve, com as informações contrastadas que<br />

lhe foram oferecidas e com as observações bem documentadas que ele<br />

levou a termo estará fazendo um pouco <strong>de</strong> metafísica rústica; ou<br />

po<strong>de</strong>rá ven<strong>de</strong>r sua pesquisa a bom preço jornalístico. Mas a ciência não<br />

trata diretamente da realida<strong>de</strong>, senão <strong>de</strong>sses efeitos que a realida<strong>de</strong><br />

produz na experiência da pesquisa. Nisso, não há diferença entre o<br />

trabalho <strong>de</strong> campo e o do laboratório. Para usar um exemplo fácil,<br />

claro e <strong>de</strong>sagradável, quem faz uma experiência com ratinhos brancos<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um laberinto, reunirá uma série <strong>de</strong> dados sobre como os<br />

ratinhos brancos se comportam <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um laberinto, não sobre os<br />

ratinhos brancos em geral. A partir <strong>de</strong>sses dados po<strong>de</strong>rá inferir muitas<br />

coisa a respeito <strong>de</strong>sses ratinhos ou dos processos cognitivos em geral,<br />

mas dar a esses dados em si um valor que ultrapasse as condições em<br />

que eles foram obtidos é um <strong>de</strong>lito <strong>de</strong> lesa-empiria. Um trabalho <strong>de</strong><br />

campo é, como já dissemos, uma situação muito menos controlada que<br />

a do laboratório, não por isso <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma situação ad hoc.<br />

Qualida<strong>de</strong> dos dados<br />

O mundo não é feito <strong>de</strong> dados. Os dados são produzidos por nós<br />

observando o mundo, são produzidos por nossos interlocutores quando<br />

respon<strong>de</strong>m às nossas perguntas. É o método que seguimos, esse<br />

método que po<strong>de</strong> ser muito simples mas que <strong>de</strong>ve ser explícito, quem<br />

da uma razoável garantia <strong>de</strong> que esses dados são reais, porque <strong>de</strong>fine<br />

seu contexto e seu critério <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>. Os dados não são reais per se,<br />

mesmo os dados que po<strong>de</strong>riam parecer mais indiscutíveis, como por<br />

exemplo um censo. Pensemos um exemplo simples: o dado “a al<strong>de</strong>ia X<br />

tem cento quarenta e quatro habitantes” será um dado genuíno (um<br />

dado “real”) se nós a acompanhamos com a informação suficiente<br />

sobre como e quando obtivemos essa informação. Todos os requisitos<br />

<strong>de</strong> método colaboram para manter um certo controle sobre essa<br />

realida<strong>de</strong> dos nossos dados, especificando como, quando, on<strong>de</strong>, para<br />

quem, etc. Essa realida<strong>de</strong> é real. Procuremos um exemplo muito<br />

contrario: Fulano, habitante do médio Amazonas, me diz que ele é<br />

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