digital - Comunidade Virtual de Antropologia
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Oscar Calavia Sáez<br />
<strong>de</strong>ixa-lo falar, porque ainda não sabe quê conexão po<strong>de</strong> haver entre as<br />
efeméri<strong>de</strong>s familiares e a política. Nessas primeiras entrevistas, o<br />
entrevistador <strong>de</strong>ve intervir, fundamentalmente, quando o dialogo<br />
esmorece, e nesse caso po<strong>de</strong>, sim, reconduzir ao tema inicial ou bem<br />
propor um outro tema próximo. Outro pressuposto que <strong>de</strong>vemos<br />
<strong>de</strong>scartar é que a dicotomia entrevistador/entrevistado entre <strong>de</strong>ntro das<br />
convenções dialógicas locais: em muitas ocasiões, será difícil obter<br />
qualquer tipo <strong>de</strong> resposta se o entrevistador se recusa a, por sua vez,<br />
oferecer informações próprias em troca. Esse tipo <strong>de</strong> dialogo simétrico,<br />
no qual é bom participar sempre que seja requerido, po<strong>de</strong> ser um<br />
exercício muito produtivo, pela simples razão <strong>de</strong> que às vezes<br />
representará um esforço comparativo feito pelo próprio interlocutor.<br />
Nem sempre: o pesquisador po<strong>de</strong> ser também submetido a um<br />
interrogatório que não tem a ver com nenhuma curiosida<strong>de</strong> sobre o<br />
seu modo <strong>de</strong> vida ou suas relações, mas simplesmente almeja retribuir<br />
<strong>de</strong> algum modo aos interrogatórios <strong>de</strong>le. Seja como for, não há bons<br />
motivos para guardar secretos perante as pessoas das quais esperamos<br />
que nos revelem os <strong>de</strong>las.<br />
Com “explicar o tema da entrevista” estamos nos referindo a uma<br />
explicação formal, feita no momento em que a entrevista é pedida, e<br />
antece<strong>de</strong>ndo a entrevista propriamente dita em –po<strong>de</strong> ser uma boa<br />
medida- um dia. Isto é: a entrevista etnográfica não é uma entrevista<br />
na hora. Não há nenhum interesse propriamente etnográfico em<br />
entrevistar um interlocutor <strong>de</strong>sprevenido; menos ainda com a ilusão<br />
<strong>de</strong> que suas respostas sejam assim mais espontâneas ou autênticas.<br />
Surpreen<strong>de</strong>r o interlocutor, via <strong>de</strong> regra, significa que ele terá pouco<br />
ou nada que dizer. Ou que recorrerá a fórmulas muito conhecidas:<br />
“é o jeito que nós faz”<br />
“a gente sempre fez assim”.<br />
Boa parte daquela velha idéia <strong>de</strong> que as socieda<strong>de</strong>s “primitivas” são<br />
pré-lógicas, obtusas e aferradas à tradição proce<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrevistadores<br />
que, baixando <strong>de</strong> repente numa al<strong>de</strong>ia, perguntavam a queima-roupa<br />
coisas como<br />
“Qual é a origem do mundo?”<br />
O interlocutor <strong>de</strong>ve ter tempo para pensar (ou para lembrar, ou<br />
para consultar com outros...), porque, como já foi dito, ele faz dados,<br />
não os tira do bolso já feitos. Não há “cultura” com respostas prontas<br />
para todas as nossas perguntas, e a idéia da espontaneida<strong>de</strong>, como tal,<br />
parte exatamente <strong>de</strong>sse pressuposto falso.<br />
É importante lembrar que a entrevista etnográfica difere<br />
radicalmente da entrevista jornalística, que por razões obvias é o<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> entrevista que todos conhecemos melhor. A entrevista<br />
jornalística –mesmo nos casos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s entrevistas acordadas<br />
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