digital - Comunidade Virtual de Antropologia
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Oscar Calavia Sáez<br />
acadêmico que, supostamente, <strong>de</strong>ixe seu trabalho mais digno e em<br />
geral mais ilegível.<br />
Segunda, o pesquisador não tem nem objeto nem <strong>de</strong>scrição, e <strong>de</strong><br />
fato está precisando <strong>de</strong> teoria para chegar a elabora-los –não para<br />
acrescentar a eles.<br />
Outra <strong>de</strong>claração digna <strong>de</strong> preocupação é esta, também muito fácil<br />
<strong>de</strong> ouvir:<br />
-Professor, estou querendo fazer uma pesquisa sobre X<br />
usando a Derrida (ou a Gid<strong>de</strong>ns, ou a Strathern, ou a Latour)<br />
É perfeitamente razoável que autores como estes ou outros<br />
constituam inspirações importantes numa pesquisa. Mas esse modo <strong>de</strong><br />
dize-lo faz temer que essa inspiração tome formas in<strong>de</strong>vidas. Usar um<br />
autor po<strong>de</strong> significar coisas como:<br />
a) Acrescentar uns bibelôs teóricos à pesquisa. Desnecessário e<br />
kitsch.<br />
b) Refrasear uma pesquisa qualquer no idioma <strong>de</strong>ste ou daquele<br />
autor. Lembra as traduções automáticas.<br />
c) Repetir a obra do autor admirado, mudando apenas o nome dos<br />
personagens e os <strong>de</strong>corados. Plágio branco.<br />
Na verda<strong>de</strong>, a relação entre um autor qualquer e todos os autores<br />
que o inspiram <strong>de</strong>ve se parecer mais a uma relação genética. Cada um<br />
<strong>de</strong> nós recolhe a herança genética <strong>de</strong> uma infinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ancestrais,<br />
mas quando se trata <strong>de</strong> fazer um filho o faz por si mesmo, usando<br />
recursos convencionais ou novas tecnologias. Mas em qualquer caso<br />
(pelo menos na tradição oci<strong>de</strong>ntal, e no estado atual da reprodução<br />
assistida) ninguém diz:<br />
-Vou fazer um filho usando o meu bisavó Eleutério.<br />
Enfim, é obvio que autores interessantes <strong>de</strong>vem participar na<br />
elaboração dos nossos trabalhos, e ser <strong>de</strong>vidamente citados por isso.<br />
Mas o único modo <strong>de</strong> que o façam bem é que eles sejam bem<br />
compreendidos e inseridos ou digeridos na própria constituição teórica<br />
do pesquisador.<br />
Tudo isto quer dizer também que as novida<strong>de</strong>s teóricas não são<br />
maduras e férteis até que sejam capazes <strong>de</strong> gerar um corpus<br />
consistente <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrições, e não só <strong>de</strong> citações reverentes. Uma teoria<br />
brilhante que não é capaz <strong>de</strong> provocar um modo diferente <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrição<br />
não é, a rigor, teoria. A teoria é um mo<strong>de</strong>lo que seleciona termos e,<br />
como já foi dito, leva consigo, implícita ou explícita, as escolhas <strong>de</strong><br />
método. Por isso, o seu efeito principal não <strong>de</strong>ve se encontrar na sua<br />
explicitação, que em si tem um valor apenas auxiliar, e sim na<br />
produção e organização dos dados, e na sua exposição.<br />
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