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digital - Comunidade Virtual de Antropologia

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Oscar Calavia Sáez<br />

Algumas páginas <strong>de</strong>ste livro se aproximam do gênero da autoajuda.<br />

Quiçá seja lamentável, mas é inevitável. A elaboração <strong>de</strong> uma<br />

ou várias teses tem se transformado num capítulo obrigatório na vida<br />

<strong>de</strong> boa parte das classes médias da meta<strong>de</strong> do mundo. A pesquisa tem<br />

se assimilado aos poucos a um ritual <strong>de</strong> passagem no ciclo vital, algo<br />

(quase) mais visceral que cerebral, (quase) mais privado que<br />

profissional. Estar “em tese” passou a ser uma fase da vida,<br />

previsivelmente marcada por crises pessoais e doenças, abrindo um<br />

mercado promissor a terapeutas das mais diversas obediências. A<br />

gravi<strong>de</strong>z ou o parto (gravi<strong>de</strong>z e parto, note-se, sempre difíceis)<br />

passaram a ser metáforas da elaboração <strong>de</strong> uma pesquisa mais<br />

convincentes que aquelas outras, clássicas, da <strong>de</strong>scoberta ou da<br />

iluminação. Talvez tenha sido sempre assim, mesmo cem anos atrás:<br />

mas as angústias da tese têm <strong>de</strong>ixado o foro íntimo do pesquisador<br />

para ser discutidas em artigos e seminários, e isso já faz diferença.<br />

Pessoalmente não me entusiasma essa tendência, mas se a pesquisa é<br />

entendida pelos seus praticantes como um episódio <strong>de</strong> aflição não seria<br />

muito antropológico continuar tratando <strong>de</strong>la como se fosse uma<br />

ativida<strong>de</strong> normal <strong>de</strong> sujeitos em pleno uso da sua saú<strong>de</strong>. As páginas a<br />

seguir, portanto, tratam não só <strong>de</strong> como fazer uma pesquisa, mas<br />

também <strong>de</strong> como sobreviver a ela.<br />

Alguém po<strong>de</strong>rá talvez achar conservadores ou mesmo antiquados<br />

alguns juízos e argumentos aqui expostos. Mas nas páginas a seguir<br />

não achei muita razão para dar um gran<strong>de</strong> privilégio a elaborações<br />

teóricas recentes sobre outras pouco ou muito mais antigas. O leitor<br />

<strong>de</strong>cidirá no fim se essa atitu<strong>de</strong> se justifica. Caso prefira se informar<br />

sobre a ortodoxia mais recente, a encontrará com facilida<strong>de</strong> nas fontes<br />

a<strong>de</strong>quadas, que na medida do possível incluirei na bibliografia.<br />

Apesar do que acabo <strong>de</strong> dizer, será fácil reconhecer também minhas<br />

afinida<strong>de</strong>s com toda uma série <strong>de</strong> autores que no momento <strong>de</strong>sfrutam<br />

<strong>de</strong> prestígio e costumam ser reunidos sob rótulos atrativos como<br />

antropologia simétrica, antropologia pós-social ou teoria ator-re<strong>de</strong>. Isso<br />

não <strong>de</strong>ve enganar: esse interesse parte da convicção <strong>de</strong> que no<br />

essencial essas idéias <strong>de</strong> vanguarda reeditam oportunamente idéias<br />

nem sempre tão novas.<br />

Este livro foi escrito como uma coleção <strong>de</strong> verbetes avulsos, e<br />

<strong>de</strong>pois, aos poucos, organizado em seqüência. Não estou seguro <strong>de</strong> que<br />

a sua leitura linear seja preferível a essa leitura aleatória que se aplica<br />

a dicionários, enciclopédias ou coleções <strong>de</strong> aforismos. Por isso, o leitor<br />

é livre -nem precisava dizer, o leitor sempre faz o que quer- <strong>de</strong> se guiar<br />

pela or<strong>de</strong>m das paginas ou pelo índice remissivo. Enquanto escrevo,<br />

não sei ainda qual será o <strong>de</strong>stino <strong>de</strong>ste trabalho, e por isso tento que ele<br />

se mantenha viável como texto linear suscetível <strong>de</strong> ser publicado em<br />

forma <strong>de</strong> livro, e como hipertexto, pronto para ser divulgado em<br />

suporte <strong>digital</strong>.<br />

Intuo que o será principalmente nesta segunda modalida<strong>de</strong>. O<br />

mundo editorial <strong>de</strong> hoje percebe-se a si mesmo como prestador <strong>de</strong><br />

serviços, e não mais como produtor <strong>de</strong> bens culturais. O <strong>de</strong>stinatário<br />

<strong>de</strong>sses serviços é o autor, ou sua instituição, não o leitor. Graças à<br />

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