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digital - Comunidade Virtual de Antropologia

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Esse obscuro objeto da pesquisa<br />

ele é suscetível <strong>de</strong> melhora. Em princípio pareceria fácil imaginar uma<br />

tese sobre um objeto absolutamente novo, inédito ou inaudito. Mas se<br />

esse objeto não faz referencia ao saber anterior ele não seria ciência,<br />

lembremos o que já foi dito a respeito.<br />

As teses, portanto, atacam algo. E são <strong>de</strong>fendidas, <strong>de</strong>vem ser<br />

<strong>de</strong>fendidas porque <strong>de</strong>vem conter um mínimo <strong>de</strong> agressão a um saber<br />

prévio. Tinham-no, olhe-se bem, mesmo no contexto conservador da<br />

universida<strong>de</strong> medieval. O estilo cada vez mais jovial e pacífico das<br />

<strong>de</strong>fesas, e sua crescente percepção como ritual (“apenas um ritual”,<br />

uma noção estranha para um antropólogo) é índice <strong>de</strong> que em alguns<br />

sentidos a instituição que agora se auto-<strong>de</strong>fine pela inovação po<strong>de</strong><br />

chegar a ser mais conservadora que sua pre<strong>de</strong>cessora do tempo dos<br />

castelos: a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> uma tese é pensada como um passo programado<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma carreira e da ativida<strong>de</strong> das agencias financiadoras.<br />

Quem leia isto po<strong>de</strong> se tranqüilizar ou se <strong>de</strong>cepcionar com isso; mas<br />

em qualquer caso não po<strong>de</strong> exigir que seja assim. Nominalmente, para<br />

triunfar com uma tese continua sendo necessário <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>-la.<br />

Toda tese é pesquisa, mas não a pesquisa toda.<br />

Um catedrático espanhol da época franquista orientava assim aos<br />

seus alunos:<br />

“Preparem sua tese <strong>de</strong> doutorado até os trinta anos. Nos<br />

trinta anos seguintes, publiquem os resultados<br />

paulatinamente, com cuidado <strong>de</strong> não queimar <strong>de</strong>masiado<br />

material <strong>de</strong> uma só vez; chegado aos sessenta anos, voltem a<br />

publicar os seus primeiros artigos, com a certeza <strong>de</strong> que mais<br />

ninguém lembra <strong>de</strong>les”.<br />

O conselho <strong>de</strong>nota um campo intelectual estagnado, em que os<br />

pesquisadores são poucos, a pesquisa e a publicação são raras e a<br />

inovação intelectual mal tolerada; mas ilustra uma situação muito<br />

mais comum.<br />

Um resultado discutível do vínculo da pesquisa com o sistema<br />

acadêmico é que a maior parte da pesquisa esteja vinculada à obtenção<br />

<strong>de</strong> graus acadêmicos. Por isso, <strong>de</strong> um lado, sofre sempre a tentação <strong>de</strong><br />

agradar à nomenklatura que administra esses graus, e <strong>de</strong> outro se faz<br />

<strong>de</strong>snecessária quando não há mais urgência <strong>de</strong> galgar novos <strong>de</strong>graus.<br />

É claro que no papel as coisas são <strong>de</strong> outro modo. A<br />

indissolubilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino, pesquisa e extensão pertence àquele tipo<br />

<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ais que se transformam em realida<strong>de</strong> por <strong>de</strong>creto. Cada professor<br />

-ou qualquer aluno- <strong>de</strong> uma universida<strong>de</strong> é doravante, e ao mesmo<br />

tempo, um pesquisador, um docente e um divulgador, mesmo que a<br />

maior parte dos mortais não seja capaz <strong>de</strong> ser sequer duas <strong>de</strong>ssas coisas<br />

ao mesmo tempo.<br />

Não importa: basta que o sujeito distribua suas ativida<strong>de</strong>s numa<br />

gra<strong>de</strong> com essas três rubricas. Isso produz números impressionantes, e<br />

em particular favorece a proliferação <strong>de</strong> pesquisa ad hoc, validada por<br />

um sistema ávido <strong>de</strong> números. As socieda<strong>de</strong>s quentes, para lembrar a<br />

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