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Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

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então, afim <strong>de</strong> trazê-la <strong>de</strong> volta. Diante do relato, Ozon tem o estalo para seu filme, ao que ele<br />

adiciona ainda a experiência <strong>de</strong> Vertigo, <strong>de</strong> Hitchcock (1958), e o jogo em fazer ‘reviver’ uma pessoa<br />

já morta.<br />

Descrevendo seu próprio filme como transgênero, Ozon vai recriar a estória <strong>de</strong> Ren<strong>de</strong>ll,<br />

incluindo ingredientes do relato <strong>de</strong> Poupaud e imprimindo perspectivas que, cotejando na tela<br />

comédia e drama, propiciam e impõem uma firme reflexão sobre a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Ozon afirmou em<br />

entrevista que não queria terminar a película com a mesma morte dramática <strong>de</strong> Ren<strong>de</strong>ll e que<br />

gostaria <strong>de</strong> mostrar uma estória <strong>de</strong> amor, oferecendo aos personagens a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter sua<br />

própria estória.<br />

Não se po<strong>de</strong> pensar o ‘ser homem’ ou o ‘ser mulher’ como experiências fixadas pela<br />

natureza, assim como não se po<strong>de</strong> pensa-los unicamente como imposição externa realizada por meio<br />

<strong>de</strong> normas sociais ou pela pressão <strong>de</strong> instâncias <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Fato é que os indivíduos constroem a si<br />

mesmos como masculinos ou femininos, reivindicando um lugar na or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> gênero ou respon<strong>de</strong>ndo<br />

ao lugar que lhes é dado [CONNEL; PEARSE, 2015, p. 39]. Para além da polarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gêneros, as<br />

ambiguida<strong>de</strong>s não são raras, produzindo mulheres masculinas e homens femininos. O<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da ‘i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gênero’ po<strong>de</strong>, então, resultar em um padrão intermediário,<br />

misturado ou contraditório, configurando assim uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> queer ou transgênera, como nos<br />

apresenta Ozon.<br />

A trama Ozoniana<br />

Diferentemente da novela <strong>de</strong> Ren<strong>de</strong>ll, não há qualquer crime em cena, apesar da película<br />

iniciar com a morte, a cerimônia do enterro <strong>de</strong> Laura (nome da personagem falecida, provavelmente<br />

inspirado do filme Laura, <strong>de</strong> Otto Preminger). Laura é amiga <strong>de</strong> infância e inseparável <strong>de</strong> Claire e<br />

morreu pouco após o parto da filha Lucie, que teve com o marido David. O filme inicia com o velório,<br />

Claire anunciando em frente ao marido Gilles e à família, em uma igreja, que prometera à amiga que<br />

se ocuparia <strong>de</strong> seu marido e sua filha. É ela quem informa o espectador sobre o contexto, em flash<br />

back, até recuperarmos o tempo presente da trama, após o enterro <strong>de</strong> Laura. O marido David, por<br />

volta dos 30 anos e sozinho com o bebê vive o luto da esposa <strong>de</strong> forma singular. Ozon não faz<br />

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