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Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

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novida<strong>de</strong> naquele momento, cujos saldos mais interessantes po<strong>de</strong>riam ser notados na exploração <strong>de</strong><br />

valores que antes foram amplamente explorados pela literatura <strong>de</strong> não muito atrás.<br />

Pelos artigos em jornais do crítico baiano e por seus diálogos em carta, Saraceni já vinha<br />

antes sendo sublinhado como um dos gran<strong>de</strong>s talentos entre os mais jovens. Era o caso <strong>de</strong> Arraial do<br />

cabo, o curta-metragem documentário que levou Saraceni à Europa, cuja repercussão apontava-o<br />

como um dos representantes <strong>de</strong> uma nova mentalida<strong>de</strong> que surgia no cinema brasileiro, um dos<br />

principais estouros intelectuais <strong>de</strong>sta nova geração (Cf. ROCHA, 8 jul. 1961, p. 7; ROCHA, 12 ago.<br />

1961, p. 4.). Era o caso do que dizia aos seus interlocutores epistolares. Em carta a Jean-Clau<strong>de</strong><br />

Bernar<strong>de</strong>t, no mesmo ano <strong>de</strong> publicação do livro, Glauber chama a atenção do crítico para a figura <strong>de</strong><br />

Saraceni, <strong>de</strong>finindo-o no seguinte plano: “É um artista, um excelente diretor, sabe a ‘mise em scène’,<br />

vive a ‘mise em scène’. É a ‘mise em scène’, se você me permite” (ROCHA, 1997, p. 180). Daí para<br />

fazê-lo eleito como um legítimo representante do intercâmbio entre o mundo literário e o<br />

cinematográfico não foi difícil, como se <strong>de</strong>ve imaginar.<br />

Leve-se em conta que em Revisão crítica o autor aposta na investigação dos estilos <strong>de</strong> cada<br />

um dos seus favoritos. Definir um novo estilo para o cinema brasileiro <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ria <strong>de</strong> tal investida e<br />

estratégia. Com isso em mente, Glauber explorou a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estilo <strong>de</strong> Porto das Caixas para a<br />

partir <strong>de</strong>la, a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste estilo, conectar as duas formas <strong>de</strong> expressão artística, <strong>de</strong> dois campos<br />

culturais distintos, porém ligados. Veja-se uma das hipóteses reveladas por Glauber. Saraceni,<br />

embora com argumento original <strong>de</strong> Lúcio Cardoso e tendo recebido formação literária <strong>de</strong>ste e <strong>de</strong><br />

Octavio <strong>de</strong> Faria, havia realizado uma versão muito pessoal <strong>de</strong> Angústia <strong>de</strong> Graciliano. Primeiro,<br />

chama a atenção para as abordagens comuns, entre uma e outra obra: “enquanto em Angústia, o<br />

pobre e amargurado Luiz da Silva concentra no gordo capitalista Julião Tavares todo o seu ódio e lhe<br />

imputa as responsabilida<strong>de</strong>s das <strong>de</strong>sgraças sociais, evoluindo maciçamente para o crime por<br />

enforcamento – a mulher <strong>de</strong> Porto das Caixas proce<strong>de</strong> da mesma forma em relação ao marido”<br />

(ROCHA, 2003, p. 141). Em seguida, o grau <strong>de</strong> comparação dá-se pelos estilos entre uma e outra<br />

arte, criando graus <strong>de</strong> equivalências entre literatura e cinema: o estilo seco e analítico <strong>de</strong> Graciliano<br />

encontra correspondência no ritmo executado pelo filme <strong>de</strong> Saraceni que se manteve longe das<br />

metáforas fáceis e, num gesto ousado, pô<strong>de</strong> eliminar o artificialismo do suspense, indicando que<br />

haverá, sim, o crime da mulher face ao marido. Em pauta, estava a exploração da mulher, mas não<br />

só ela. Institucionalizava-se também a análise daquilo que gerou uma tonalida<strong>de</strong> ao filme, cuja<br />

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