03.06.2016 Views

Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Jackson, sendo imediatamente seguido por Neneco, que, agora cantando, também é enquadrado.<br />

Neneco segue cantarolando por alguns instantes o hit enquanto também faz caretas.<br />

A segunda sequência apresenta toda a comunida<strong>de</strong> Mbya-Guarani reunida, durante a noite,<br />

em uma festa na al<strong>de</strong>ia. Palermo, novamente diante da câmera, prossegue com suas encenações.<br />

Dessa vez, um <strong>de</strong> seus amigos da al<strong>de</strong>ia aproxima-se e diz: “Você não enten<strong>de</strong>u, Palermo? Não é<br />

para ficar <strong>de</strong> palhaçada só porque estão te filmando, tem que pegar as meninas para dançar, isso<br />

sim”. Palermo, apesar do “puxão <strong>de</strong> orelha” do amigo que, em certa medida, também atua para a<br />

câmera, segue sua auto-mise en scène e, em seu grupo <strong>de</strong> amigos, li<strong>de</strong>ra as brinca<strong>de</strong>iras. Na<br />

terceira sequência reencontramos Palermo e Neneco na al<strong>de</strong>ia indo até uma fazenda vizinha comprar<br />

sabão, momento em que também pe<strong>de</strong>m pão para uma senhora. Os dois garotos brincam, pulam,<br />

caem no chão e um empurra o outro, fazem caretas para a câmera e cantam novamente a música<br />

Beat it. Nesse momento, Neneco, olhando para a câmera, pergunta ao cineasta se eles po<strong>de</strong>rão<br />

assistir <strong>de</strong>pois ao material filmado e recebe uma resposta afirmativa <strong>de</strong> Ariel Ortega. Segundos<br />

<strong>de</strong>pois, Palermo começa a imitar os passos <strong>de</strong> Michael Jackson, o famoso moonwalk, e continua<br />

cantando Beat it, em um dos momentos, sem dúvidas, mais performáticos do documentário, o qual é<br />

acentuado pelos jump-cuts e a trilha sonora extra-diegética empregada.<br />

A profilmia liberadora tem em Bicicletas <strong>de</strong> Nhan<strong>de</strong>ru um efeito <strong>de</strong> sentido <strong>de</strong> uma auto-mise<br />

en scène levada ao seu limite fabulatório, permitindo ao sujeito filmado inventar a si mesmo,<br />

libertando atitu<strong>de</strong>s e palavras, fazendo surgir pensamentos, sentimentos e comportamentos até então<br />

não expressos. É empregada pelos cineastas indígenas com o nítido papel <strong>de</strong> instaurar uma reflexão<br />

(NINEY, 2009, p. 49) no espectador sobre a situação dos povos indígenas 3 .<br />

Já a profilmia heurística surge em A festa do rato como um artifício estético e criativo<br />

empregado como simulação (NINEY, 2009, p. 48) para o espectador <strong>de</strong> um universo lendário e mítico<br />

que é materializado nos filmes através da encenação. Outro aspecto que merece ser apontado é o<br />

fato <strong>de</strong> que a encenação, sendo feita por atores nativos e na própria al<strong>de</strong>ia indígena, intensifica ainda<br />

mais a colaboração entre cineastas e sujeitos filmados, fundamental para a realização dos<br />

documentários em questão e que perpassa todo o processo <strong>de</strong> realização cinematográfica.<br />

3 Nesse sentido, diz Amaranta César (2012, p. 96) sobre as performances dos irmãos Palermo e Neneco, em<br />

Bicicletas <strong>de</strong> Nhan<strong>de</strong>ru, que: “No lugar da exuberância do ritual xinguano, há uma reflexão sobre a relação<br />

<strong>de</strong>sastrosa com a alterida<strong>de</strong> (a nação brasileira como alterida<strong>de</strong>) e uma certa <strong>de</strong>fesa da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

enfrentá-la sem ce<strong>de</strong>r às exigências <strong>de</strong> um certo ‘i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> pureza’”.<br />

485

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!