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Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

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movimento da câmera em si, o rastro da imagem. Em Bressane, o caráter figurativo das imagens está<br />

sempre preservado, evitando a abstração proposta por Limite. Ao invés do rigor dos enquadramentos<br />

<strong>de</strong>ste, a câmera em Bressane é mais “solta”, e chega a se transformar em presença corpórea que se<br />

relaciona com os personagens, como nas caminhadas pelo <strong>de</strong>scampados, cena que se repete mais<br />

<strong>de</strong> uma vez em A agonia.<br />

Em Mário Peixoto, vai-se do rigor <strong>de</strong> composição à câmera completamente solta; das linhas<br />

geometricamente compostas do quadro à vertigem absoluta. Em Bressane, por outro lado, a<br />

construção formal traz sempre a marca <strong>de</strong> uma “impossibilida<strong>de</strong>”: o relativo <strong>de</strong>sequilíbrio no<br />

enquadramento a ressaltar o caráter improvisado e precário das imagens.<br />

Conforme é nosso intuito <strong>de</strong>monstrar, o objetivo <strong>de</strong> A agonia, ao lançar mão <strong>de</strong> uma<br />

“memória” – um “rastro” – <strong>de</strong> Limite, é tentar (re)construir, a partir das imagens <strong>de</strong> Mário Peixoto, uma<br />

tradição do experimental no cinema brasileiro.<br />

“<strong>Cinema</strong> da lepra”<br />

Para <strong>de</strong>screver Limite, Francisco Elinaldo Teixeira usa a expressão “imagem germe” e cita<br />

um “cinema da lepra” (TEIXEIRA, 2003, p. 32). De fato, trata-se <strong>de</strong> um filme marcado pelas figuras da<br />

letargia, do isolamento, da doença e da morte. Em A agonia, também temos algo <strong>de</strong> letárgico<br />

transformado em elemento estético. Se, nas sequências finais <strong>de</strong> O anjo nasceu (Júlio Bressane,<br />

1969), havia dois personagens em um automóvel a rumar não se sabe para on<strong>de</strong>, em A agonia o par<br />

<strong>de</strong> personagens – ora em um automóvel, ora em uma embarcação – parece andar em círculos. Sua<br />

trajetória errática é intercalada com (e chama a atenção para) a “ausência <strong>de</strong> movimento” presente<br />

ora nos corpos dos atores, ora na própria câmera. Em A agonia, a trajetória dos personagens não<br />

chega a se realizar, seja em seus <strong>de</strong>slocamentos (não chegamos a lugar algum), seja no plano<br />

narrativo (não há conclusão para o entrecho dramático que, aliás, é quase inexistente). Ao invés <strong>de</strong><br />

terminar, conforme o texto do crédito final, o filme se “INTER-ROMPE”:<br />

aqui se INTER-ROMPE.<br />

este filme não tem fim.<br />

só início e meio<br />

o meio é o FIM...<br />

As <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iras sequências insistem em colocar os personagens em <strong>de</strong>slocamentos – que não<br />

chegam a lugar algum. E o único “retorno” possível é a Mário Peixoto e Limite – filme em que os<br />

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