03.06.2016 Views

Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

I. Fotograma <strong>de</strong> “O Anúncio feito a Maria” (1991), <strong>de</strong> Alain Cuny<br />

Vejamos o que diz João Bénard da Costa acerca <strong>de</strong>sse bibelô e outros sinais <strong>de</strong> impureza<br />

presentes no filme <strong>de</strong> Cuny:<br />

Na cozinha da casa <strong>de</strong> Violaine, vemos um bibelô (um gato japonês) que<br />

nada tem que ver com aquela época ou aquele lugar, e que parece estar ali<br />

como mais tar<strong>de</strong> o vaso <strong>de</strong> vidro transparentíssimo ou a flor do jarro, como<br />

outros tantos apelos a uma sombria se<strong>de</strong> <strong>de</strong> luci<strong>de</strong>z. Mas, mais tar<strong>de</strong>, muito<br />

mais tar<strong>de</strong>, na gran<strong>de</strong> cena entre Violaine e Mara (precedida,<br />

espantosamente, pela legenda escrita que fala do abismo e do peixe) a<br />

imagética é quase surrealista, com o cão enorme sentado na ca<strong>de</strong>ira, a<br />

vaca, e os burros que se vem juntar às duas irmãs como num presépio<br />

<strong>de</strong>mencial. (...) Noutras passagens, os anacronismos são sonoros (os<br />

cantos infantis), noutras, ainda, Cuny proce<strong>de</strong> a colagens como quando<br />

insere <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong> igrejas ou quadros <strong>de</strong> Van Eyck. Noutras <strong>de</strong>compõe,<br />

como nesse fabuloso plano da mão cortada <strong>de</strong> Violaine, enterrada na terra.<br />

(BÉNARD DA COSTA, 2009).<br />

O texto <strong>de</strong> João Bénard da Costa já dá algumas boas dicas acerca do paralelo que<br />

<strong>de</strong>sejamos estabelecer com os preceitos simbolistas, já que explicita as suas principais<br />

características (a soberania da palavra poética e os sinais visuais como reflexos do Inteligível),<br />

dialogando também – no caso <strong>de</strong> Paul Clau<strong>de</strong>l – com o seu misticismo. Como bem observou João<br />

Bénard, Alain Cuny consegue adaptar a peça “sem jamais psicanalisar Clau<strong>de</strong>l”, com uma<br />

compreensão muito aguda da raiz “mágica e pagã do catolicismo do autor”.<br />

Talvez um católico apaixonado pelo texto <strong>de</strong> Clau<strong>de</strong>l se sentisse incomodado pelo filme <strong>de</strong><br />

Cuny, pois ele parece tornar bem mais explícita essa suposta raiz mágica e pagã do texto original.<br />

Vejamos a série <strong>de</strong> mosaicos que aparecem inseridos no filme, durante um diálogo entre Violaine e<br />

580

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!