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Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

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paisagem do vilarejo Canrey Chico para a criação do lugarejo fictício chamado Manayaycuna. Da<br />

relação da cultura local, preservada e rígida, com o que lhe é externo surgem os maiores conflitos da<br />

narrativa, cujo nome da protagonista indica o grau <strong>de</strong> isolamento daquela comunida<strong>de</strong>, representada<br />

também pela caixa <strong>de</strong> guardados <strong>de</strong> Ma<strong>de</strong>inusa que traz recortes, revistas e outros objetos do mundo<br />

exterior, como os brincos <strong>de</strong> sua mãe, índice da presença <strong>de</strong> outrora e símbolo <strong>de</strong> sua fuga.<br />

Nas primeiras sequências, o espaço é apresentado <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>notativa, ilustrando o<br />

cotidiano <strong>de</strong> Ma<strong>de</strong>inusa: a caça aos ratos, a sauda<strong>de</strong> da mãe, a convivência com a irmã. O uso <strong>de</strong><br />

belas paisagens andinas e a profusão <strong>de</strong> elementos visuais surgem em pequenas doses, conforme<br />

se <strong>de</strong>senvolve a festa. Fogos, roupas coloridas, ban<strong>de</strong>iras e até mesmo um enorme painel<br />

cenográfico para apresentação da virgem, conferem certo grau <strong>de</strong> artificialida<strong>de</strong> aos sets. Tal<br />

característica, no entanto, estabelece uma relação privilegiada com a narrativa, já que esta transcorre<br />

num período muito especial para aquela comunida<strong>de</strong> e as tradições ali apresentadas são muito<br />

particulares, sendo em parte apresentadas ao espectador através da dimensão visual oferecida pelos<br />

elementos da direção <strong>de</strong> arte.<br />

Quando <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> refilmar “O Romance <strong>de</strong> Aniceto e Ana Francisca”, que em 1966, havia sido<br />

narrado em preto-e-branco e totalmente ambientado em locações, o diretor argentino Leonardo Fávio<br />

opta por ambientar a história em um filme colorido, <strong>de</strong> cenários construídos em um gran<strong>de</strong> galpão por<br />

cenotécnicos do Teatro Colón. Um povoado, uma casa <strong>de</strong> estuque, um acampamento <strong>de</strong> ciganos,<br />

<strong>de</strong>ntre outros, são artificialmente reconstruídos. A luz <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> lua <strong>de</strong> cartão e nuvens <strong>de</strong><br />

algodão embalam, em forma <strong>de</strong> filme-ballet, a versão <strong>de</strong> 2008, Aniceto, exibida no projeto.<br />

Na busca do que há <strong>de</strong> traço visual comum entre as duas propostas <strong>de</strong> ambientação da<br />

encenação po<strong>de</strong>mos apontar a textura como o elemento <strong>de</strong> permanência, que, ainda em concepções<br />

tão diversas se mantém enquanto i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> daquelas construções. A casa <strong>de</strong> Aniceto obe<strong>de</strong>ce à<br />

mesma configuração espacial simples: uma cama, uma janela, uma porta. A textura indica que, ainda<br />

que plasticamente nossa visão seja ativada pelas cores ou pelo movimento da dança, aqueles<br />

espaços não foram construídos para embelezar. É essa imagem tátil que nos lembra que Aniceto e<br />

Ana Francisca são personagens populares, nos revelando que aquele ambiente é também<br />

personagem da narrativa pois representa, naquele contexto, um modo <strong>de</strong> vida culturalmente<br />

individualizado.<br />

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