03.06.2016 Views

Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Em Já visto jamais visto (2013), <strong>de</strong> Andrea Tonacci, e Quando eu for ditador (2013), da belga<br />

Yael Andrë, os cineastas utilizam arquivos pessoais registrados, impulsionados ou coletados por eles<br />

próprios. Marcado por inflexões subjetivas substanciais, esse material apresenta diferenças<br />

potenciais <strong>de</strong> tempo e <strong>de</strong> consciência. A partir <strong>de</strong>ssa incongruência primeira, as obras caminham <strong>de</strong><br />

formas praticamente opostas, embora igualmente ensaísticas. Cada qual com sua maneira singular<br />

<strong>de</strong> organizar os arquivos, ambas apresentam questões ligadas à fabricação do tempo no cinema, em<br />

especial à recuperação da experiência por meio da montagem. As possibilida<strong>de</strong>s cinematográficas <strong>de</strong><br />

recordação, seleção, invenção e reprodução permitem conectar elementos discrepantes na duração<br />

<strong>de</strong> um filme, sem suprimir os seus espaçamentos. Entre passado e futuro, entre eu e outro, entre<br />

realida<strong>de</strong> e ficção, a unificação sempre ina<strong>de</strong>quada do fluxo <strong>de</strong> imagens confere forma concreta a<br />

modos <strong>de</strong> existência imprevistos, que cruzam as fronteiras do sujeito e do objeto para receber uma<br />

realida<strong>de</strong> singular e transmissível.<br />

As imagens são carregadas pelas vivências dos cineastas, sugerindo proximida<strong>de</strong> dos<br />

mesmos às instâncias <strong>de</strong> enunciação. Em Quando eu for ditador, é um discurso em primeira pessoa,<br />

supostamente autobiográfico, constituído por imagens que foram e não foram produzidas pela<br />

diretora. Em Já visto jamais visto, é toda uma constelação áudio-visual que si<strong>de</strong>ra, espiritual ou<br />

fisicamente, em torno da figura <strong>de</strong> Tonacci. Mas essas inflexões não resultam na <strong>de</strong>marcação <strong>de</strong> um<br />

sujeito fílmico unívoco, i<strong>de</strong>ntificado ao autor. As contiguida<strong>de</strong>s subjetivas são continuamente<br />

<strong>de</strong>slocadas pelas <strong>de</strong>rivas ensaísticas da montagem, as relações entre as imagens são reconstruídas<br />

ou re-apresentadas no momento da passagem. É nesse limiar que operam tanto o texto <strong>de</strong> Quando<br />

eu for ditador, quanto a escritura distráida <strong>de</strong> Já visto jamais visto, <strong>de</strong>sprovida <strong>de</strong> intervenções ou<br />

enca<strong>de</strong>amentos ostensivos.<br />

Um segundo fator <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamento, intimamente conectado à dimensão ensaística, é o<br />

distanciamento entre a captação e a retomada dos arquivos. No caso <strong>de</strong> Tonacci, são hiatos<br />

temporais entre as imagens convocadas no presente da obra, ao ponto da não coincidência entre os<br />

seus múltiplos <strong>de</strong>vires cinemáticos, seus <strong>de</strong>vires Tonacci (Cf. BRASIL; GUIMARÃES; MESQUITA,<br />

2012). No caso <strong>de</strong> Yaël Andrè, acrescenta-se a estratégia <strong>de</strong> combinar seus registros cotidianos a<br />

199

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!