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Estudos de Cinema e Audiovisual

AnaisDeTextosCompletos(XIX)

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Convém salientar que apenas poucos textos dos órgãos <strong>de</strong> grupos extraparlamentares eram<br />

assinados: foi o caso <strong>de</strong> Dedalus (Umberto Eco), que escrevia para il manifesto; mas, mesmo sem<br />

assinatura, é possível <strong>de</strong>tectar, por exemplo, a colaboração do historiador <strong>de</strong> cinema Pio Bal<strong>de</strong>lli e do<br />

crítico cinematográfico Goffredo Fofi com Lotta continua, e <strong>de</strong> Paolo Bertetto, crítico e professor <strong>de</strong><br />

cinema, com la vecchia talpa. Intelectuais já <strong>de</strong> renome, muitos dos quais, com o tempo, se<br />

projetarão ainda mais no panorama cultural italiano.<br />

O que a maioria dos articulistas criticava nessas obras era o fato <strong>de</strong> terem sido realizadas<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> estruturas cinematográficas consagradas, em oposição às “tentativas <strong>de</strong> um cinema ligado<br />

direta e intimamente ao <strong>de</strong>senvolvimento da luta <strong>de</strong> classe em nosso país, isto é, um cinema fora dos<br />

canais normais <strong>de</strong> produção e distribuição”, como assinalava Vedo Rosso (CASA; MANERA, 2012, p.<br />

45, 46-47), num artigo <strong>de</strong> 1973 <strong>de</strong>dicado ao cinema político, em que vários filmes <strong>de</strong> Damiani e La<br />

proprietà non è più un furto (Não se brinca com o dinheiro, 1973), <strong>de</strong> Petri, eram abominados,<br />

enquanto Sacco e Vanzetti (Sacco e Vanzetti, 1971), <strong>de</strong> Giuliano Montaldo, Sbatti il mostro in prima<br />

pagina ou Il <strong>de</strong>litto Matteotti (O <strong>de</strong>lito Matteotti, 1973), <strong>de</strong> Florestano Vancini, <strong>de</strong>ntre outros, <strong>de</strong>viam<br />

ser consi<strong>de</strong>rados, apesar <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> restrições:<br />

Vê-los não significa aceitá-los como obras-primas, mas discuti-los um<br />

a um, em sua tentativa <strong>de</strong> fazer crônica ou <strong>de</strong> interpretar a história. São<br />

filmes que não pertencem a um filão específico do cinema: são tentativas,<br />

contribuições, propostas. Não <strong>de</strong>vemos ter medo <strong>de</strong> criticá-los e também <strong>de</strong><br />

recusá-los: construir critérios próprios para ver e enten<strong>de</strong>r esse tipo <strong>de</strong><br />

cinema significa não sujeitar-se boquiabertos às imagens da Tela e<br />

constatar que um cinema político não existe, precisa ser construído e a<br />

<strong>de</strong>finição corrente é inútil e daninha porque leva a pensar num ponto <strong>de</strong><br />

chegada, em filmes que existem e po<strong>de</strong>m ser vistos. Nada mais falso.<br />

Esse tipo <strong>de</strong> crítica não partia apenas das páginas <strong>de</strong> periódicos <strong>de</strong> extrema-esquerda, pois<br />

os problemas levantados por Vedo Rosso já haviam sido constatados na consagrada revista <strong>Cinema</strong><br />

Nuovo, num artigo em que Goffredo Bettini e Elena Miele (1970, p. 278-281) discutiam como o<br />

sistema consolidava sua i<strong>de</strong>ologia também por meio <strong>de</strong> filmes que pareciam opor-se ao status quo do<br />

ponto <strong>de</strong> vista político, quando, na verda<strong>de</strong>, eram instrumentalizados pelo po<strong>de</strong>r, colocando-se<br />

equivocadamente como uma alternativa ao cinema <strong>de</strong> evasão:<br />

o cinema também, com suas múltiplas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> difusão e <strong>de</strong><br />

contato com o público, encontra-se, hoje cada vez mais, ligado a uma<br />

função apologética dos conteúdos e das i<strong>de</strong>ias da classe no po<strong>de</strong>r: <strong>de</strong> fato,<br />

jamais como hoje, o autor cinematográfico viu as estruturas produtivas e <strong>de</strong><br />

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