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MBV - Octirodae Brasil

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“O Mistério de Belicena Villca”<br />

Essas diferenças ocasionariam que os Príncipes lídios, agora da mesma família dos Senhores de<br />

Tharsis, aceitassem sem aprofundar o significado esotérico do Culto da Deusa do Fogo Frio, que adiante<br />

se denominaria por comum acordo Pyrena, e empregassem todo seu esforço em aperfeiçoar a forma<br />

exotérica do culto. Tal aplicação vai sempre a prejuízo da parte esotérica e, como não podia ser de outra<br />

maneira, mais tarde resultaria fatal para os tartésios. Mas isto já o verá, pois, como anunciei, estou indo<br />

passo a passo.<br />

Os lídios, como em outras indústrias, eram hábeis artesãos de pedra. Que acha que fizeram em seu<br />

afã de aperfeiçoar a forma exterior do Culto? Decidiram, ante o horror de seus parentes iberos que nada<br />

podiam fazer para impedi-los, talhar o menir do Bosque Sagrado com a figura de Pyrena; a escultura<br />

ajudava a sustentar o Culto, explicavam, pois o povo lídio necessitava de uma imagem mais concreta da<br />

Deusa: sua representação como Chama era demasiado abstrata para eles.<br />

O menir consistia numa pedra bruta de cor olivácea, de uns cinco metros de altura: os lídios se<br />

propunham a empregá-lo integralmente para talhar a cabeça da Deusa. De acordo com seu projeto, a<br />

nuca deveria ficar de frente à macieira, de tal sorte que seu divino Rosto olhasse diretamente para o<br />

povoado; e as pessoas, distribuídas na clareira circundante desde o qual se oficiavam os rituais, veria o<br />

rosto da Deusa e, por trás dela, a Macieira de Tharsis. Trabalharam dois Mestres escultores na<br />

escultura, um para esculpir o rosto e outro o cabelo, enquanto três ajudantes se ocupavam de cavar o oco<br />

da nuca, conectado com os Olhos. A obra não esteve pronta antes de cinco anos, pois ainda que as<br />

ferramentas de ferro dos lídios permitissem adiantar muito trabalho, o polimento que pretendiam dar,<br />

lhes demandou largos anos de trabalho: em verdade, os tartésios continuariam polindo por décadas a<br />

Cabeça de Pyrena, até dotá-la de impressionante realismo.<br />

A necessidade que sentiam os lídios de contemplar uma manifestação figurativa da Deusa era<br />

própria da época: os povos do Pacto Cultural experimentavam então uma queda generalizada no<br />

exoterismo do Culto, que os levava a adorar os aspectos mais formais e aparentes da Deidade. Os povos<br />

pressentiam que os Deuses se retiravam desde dentro, e que só os podiam reter desde fora: por isso se<br />

aferravam com desespero aos corpos e rostos divinos, e a qualquer forma natural que os representasse.<br />

Sendo assim, não deve surpreender o intenso fervor religioso despertado nos povos, e a extraordinária<br />

difusão geográfica, que produziu o Culto do Fogo Frio logo da transformação do menir. Além dos<br />

tartésios, orgulhosos depositários da Promessa da Deusa, homens pertencentes a mil povos diferentes<br />

peregrinavam até o Bosque Sagrado da Tartéside, para assistir o Ritual do Fogo Frio: entre outros,<br />

acudiam os iberos e ligures de todos os rincões da península, os brilhantes pelasgos da Etrúria, os<br />

corpulentos berberes da Líbia, os silenciosos espartanos da Lacônia, os pictos tatuados de Albion, etc. E<br />

todos os que chegavam a Pyrena estavam dispostos a morrer. A morrer, sim, porque esta era a condição<br />

da Promessa, o requisito de Sua Graça: como todos os adoradores sabiam, a Deusa tinha o poder de<br />

converter o homem em um Deus, de elevá-lo ao Céu dos Deuses; mas, como todos também sabiam, os<br />

raros eleitos que Ela aceitava deveriam passar pela Prova do Fogo Frio, quer dizer, pela experiência de<br />

Seu Olhar Mortal; e essa experiência geralmente acabava com a morte física do Eleito. De acordo com o<br />

que sabiam seus adeptos, e sem que tal certeza afetasse em nada a fascinação por Ela, muitos mais<br />

eram os Eleitos mortos que os comprovadamente ressuscitados; os que recebiam Seu<br />

Olhar Mortal certamente cairiam; e muitos, a maioria, jamais se levantaram; mas alguns sim, o<br />

faziam: e essa remota possibilidade era mais que suficiente para que os adoradores da Deusa<br />

decidissem arriscar tudo. Os que despertassem da Morte seriam quem verdadeiramente tinham entregado<br />

seus corações ao Fogo Frio da Deusa e aos que Ela recompensaria tomando por Esposos: por Sua<br />

Graça, ao reviver, o Eleito já não seria um ser humano de carne e osso, mas um Homem de Pedra<br />

Imortal, um Filho da Morte. Estes títulos a princípio constituíram um enigma para os Senhores<br />

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