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Lançamento do livro "História dos índios no Brasil

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vos da terra: "O Esta<strong>do</strong> [<strong>do</strong> Maranhão] épaupérrimo, sem possuir nada de seu; osque têm hoje cem escravos, dentro de poucosdias não chegam a ter seis. Os índios,de frágil condição, estão sujeitos a incrívelmortalidade, qualquer disenteria os mata,e por qualquer leve desgosto se dão a comerterra ou sal e morrer." Pouco depois,o padre João de Sousa Ferreira ilustravabem a situação demográfica e sua relaçãocom o cativeiro: "Meten<strong>do</strong> dez escravos emcasa, daí a dez a<strong>no</strong>s não havia um; masfugin<strong>do</strong> um casal para o mato, achava-sedaí a dez a<strong>no</strong>s com dez filhos." 16O abuso da mão-de-obra indígena,tanto pelos colo<strong>no</strong>s quanto pelos própriosmissionários, dava ocasião a atos rebeldes<strong>do</strong>s índios. O jesuíta Betten<strong>do</strong>rf, o principalcronista <strong>do</strong> Maranhão seiscentista, narravao caso da morte de quatro jesuítas <strong>no</strong>engenho administra<strong>do</strong> por estes <strong>no</strong> Rio Itapicuru.O Padre Francisco Pires havia manda<strong>do</strong>açoitar uma escrava "por seus desman<strong>do</strong>sem matéria <strong>do</strong> sexto[mandamento]," o que ocasio<strong>no</strong>u a fugada mesma para seu povo de origem, os tapuiasUruatis, que, por sua vez, invadirama fazenda e quebraram as cabeças <strong>do</strong>s padrese irmão jesuítas. O mesmo jesuítaigualmente relatava uma série de sublevaçõesde escravos índios nas fazendas <strong>do</strong>scolo<strong>no</strong>s, incidentes que ele atribuía ao castigodivi<strong>no</strong> pela expulsão <strong>do</strong>s padres em1661. 17Mas tais atos de violência pratica<strong>do</strong>spelos índios mostravam-se peque<strong>no</strong>s e relativamenteineficazes diante da violênciamaior <strong>do</strong> apresamento. As frequentes expedições,com ou sem autorização, com ousem a fiscalização <strong>do</strong>s jesuítas, concorrerampara o despovoamento das margense várzeas <strong>do</strong>s grandes rios da Amazóniaem curto espaço de tempo. Escreven<strong>do</strong> naúltima década <strong>do</strong> século XVII, o padreJoão de Sousa Ferreira declarava que <strong>no</strong>Rio Amazonas encontrava-se "tu<strong>do</strong> despeja<strong>do</strong>",sen<strong>do</strong> necessário viajar pelo me<strong>no</strong>sNotas1. João de Azpilcueta Navarro ao Colégio de Coimbra,agosto de 1551, Cartas <strong>do</strong>s Primeiros Jesuítas(São Paulo, Comissão <strong>do</strong> IV Centenário, 1956.vol. 1:279).<strong>do</strong>is meses até o Solimões "para alcançaralguns escravos." 18 Porém o processo nãotermi<strong>no</strong>u por aí: as tropas de resgate, osdescimentos e as expedições punitivas -práticas essas criadas e consagradas <strong>no</strong> séculoXVII — perduravam até mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>XVIII, estenden<strong>do</strong>-se a destruição para <strong>no</strong>voscampos de ação, tais como o Rio Negro,o Branco e o Madeira, entre outros.Comentários finaisAo longo deste texto, sublinhamos aimportância da presença indígena <strong>no</strong>s primeirosséculos da história <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>. Nãose trata de um simples "resgate" <strong>do</strong> homemesqueci<strong>do</strong>, nem de uma exaltação <strong>do</strong>s oprimi<strong>do</strong>sou venci<strong>do</strong>s da história. Antes procuramosdemonstrar que a história, emboraescrita e distorcida por uma pequena mi<strong>no</strong>riacom interesses próprios, foi feita e vividapor agentes muitas vezes desconheci<strong>do</strong>s.De fato, a história <strong>do</strong>s índiosapresenta um claro exemplo da omissãode um ator significativo <strong>no</strong>s <strong>livro</strong>s de históriamais convencionais, pois com a construçãoda figura <strong>do</strong> bandeirante, entre outrosmitos da colonização, o papel histórico<strong>do</strong> índio foi completamente apaga<strong>do</strong>.Ao mesmo tempo, é possível identificar<strong>no</strong> índio colonial algumas característicasconstantes <strong>do</strong> tratamento estendi<strong>do</strong> àpopulação trabalha<strong>do</strong>ra ao longo de todaa história <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>. Na verdade, trata-se<strong>do</strong> primeiro exemplo de como os grupos<strong>do</strong>minantes têm lida<strong>do</strong> com a maioria dapopulação, tratan<strong>do</strong>-a como um povo conquista<strong>do</strong>ou coloniza<strong>do</strong>, dig<strong>no</strong> de ser explora<strong>do</strong>eco<strong>no</strong>micamente e, finalmente,excluí<strong>do</strong> da história. No contraponto aquiesboça<strong>do</strong>, ressalta-se a importância das vivênciase embates desta maioria ausenteda história oficial mas que, antes de maisnada, lutou, através <strong>do</strong>s meios que dispunha,contra uma mi<strong>no</strong>ria privilegiada e ummodelo económico brutalmente injusto,que os mantinham cativos.2. Cita<strong>do</strong> em Florestan Fernandes - 1949 - A OrganizaçãoSocial <strong>do</strong>s Tupinambá. São Paulo, Progresso,pág. 36.3. "Voto <strong>do</strong> Padre António Vieira sobre as dúvidas<strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res da Cidade (sic) de São Paulo." 12de julho de 1692, Instituto de Estu<strong>do</strong>s <strong>Brasil</strong>eiros,Coleção Lamego 42.3.

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