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Lançamento do livro "História dos índios no Brasil

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Embora os paissejam osresponsáveis maisdiretos pela criaçãode seus filhos, oprocesso maisamplo desocialização éefetua<strong>do</strong> tambémpelos parentes maispróximos ou mesmopela comunidadeinteira. Menina <strong>do</strong>povo Matsés, <strong>do</strong>Vale <strong>do</strong> Javari. FotoSílvioCavuscens/CIMI.conhecimento também de característicasdesses grupos que podem ser muito "úteis"e adequadas aos tempos em que estamosingressan<strong>do</strong>.Pode-se começar pela organização política.Em muitas nações indígenas brasileiras.a organização política é marcada pelaausência de delegação de poderes. Osindivíduos não delegam poder a ninguém.Por isso, o chefe não manda, não tem poder,não dá ordens. É o representante datradição, da cultura, depositário da experiência.Em geral, é o que mais sabe, o quefala melhor. E o que mais sofre. Mas nãodá ordens.Nesses grupos de relações igualitáriasentre os indivíduos, a informação costumaser aberta: o que um sabe, to<strong>do</strong>s podemsaber; ninguém se apropria da informaçãopara transformá-la em poder político oueconómico.Da mesma forma, a relação com a terranão costuma ser uma relação patrimonial.Embora o indivíduo tenha sua casa e suaroça, embora o grupo ocupe determina<strong>do</strong>"território", a relação não é de propriedadeindividual.e sim coletiva.Enquanto na força de sua cultura, essesgrupos não costumam trabalhar paraproduzir excedentes comerciáveis. E sequercircula dinheiro entre eles.Com todas essas peculiaridades, seninguém delega poder, se ninguém seapropria da informação, se ninguém podedar ordens, será impossível estabelecerrepressão organizada. E sem repressão,não será possível a <strong>do</strong>minação de um grupopor outro grupo, ou de um indivíduopor outro grupo. Nestes tempos em quese questiona em todas as partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>a organização e as funções <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>,em que se proclama a necessidade de descentralizaro poder, de conferir auto<strong>no</strong>miaaos cidadãos, que outra organização socialpode permitir-<strong>no</strong>s uma visão mais modernae estimulante? Que pode haver demais instigante que uma sociedade ondecada indivíduo é educa<strong>do</strong> para ser auto--suficiente? Um índio na força de sua culturasabe fazer sua casa, sua rede, sua ca<strong>no</strong>a,arco e flecha, esteira e objetos dea<strong>do</strong>r<strong>no</strong>. Sabe caçar, pescar e fazer roça,não depende de ninguém para seu própriosustento. Identifica <strong>no</strong> seu ambiente plantase frutos úteis. Sabe cantar e dançar. Sabetu<strong>do</strong> de que precisa.Pode-se olhar a questão por outro ângulo,o das relações entre os sexos. Orlan<strong>do</strong>Villas Boas, cria<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Parque <strong>do</strong> Xingu,lembra que ali homens e mulheres sãoabsolutamente livres para casar-se eseparar-se quantas vezes queiram - não háimpedimentos nem sanções sociais. Mas seum homem ou uma mulher não quiserseparar-se <strong>do</strong> seu parceiro e estiver descontentecom ele por alguma razão, nãofará nenhuma queixa, porque a queixapressupõe uma expectativa de comportamentoe uma expectativa de comportamentojá é uma forma de poder sobre ooutro. Digamos que o homem não estejacontente com sua mulher porque ela nãoestá trazen<strong>do</strong> água limpa para casa - e levarágua limpa para casa é tarefa da mulher.O máximo que esse homem poderáfazer será recorrer aos pajés, aos homensmais velhos. Eles reunirão todas as mulherese explicarão porque é que naquele grupoas tarefas historicamente foram divididasdaquela forma, porque coube àsmulheres levar água para casa. Quem quiserque vista a carapuça. Mas ninguém ousará,recriminar uma mulher - lembra Orlan<strong>do</strong>.Pode haver sofisticação maior?

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