De cor morena, seu porte, em geral, é atlético,indican<strong>do</strong> o vigor físico, e o seu olhar,fixo e autoritário. Muitos a<strong>do</strong>tam posturasque indicam movimento, luta. Outros, rígi<strong>do</strong>se altivos, têm a atitude de um verdadeirochefe. Se alguns são caboclos brasileiros,a maioria deles se assemelha muitomais aos índios <strong>do</strong>s filmes <strong>no</strong>rte--america<strong>no</strong>s. com seus cocares atravessan<strong>do</strong>as costas até a altura das pernas.No interior da loja, um mun<strong>do</strong> de cheiros,cores e imagens impõe aos consumi<strong>do</strong>resas representações materiais <strong>do</strong> universomítico afro-brasileiro. Ao la<strong>do</strong> deentidades típicas da umbanda - pretos epretas velhas, Exus e pombagiras, ciganase sereias - as imagens de caboclo são asque mais se ressaltam, tanto pela quantidadecomo pela diversidade. O Pena Branca,o Junco Verde, o Tupiniquim, Tupã, Tupi,Tibiriça, Peri, Iracema, Ubirajara,Jurema, Cobra Coral. Quebra Galho... etantos outros. O vende<strong>do</strong>r possui um catálogo,com todas as imagens disponíveisna fábrica. Porém, o caboclo deseja<strong>do</strong> podeser único: um índio que anunciou-senum sonho. Nesse caso, desenha-se estecaboclo, único, e a encomenda é realizada.Embora diversas, a partir das imagenspodemos aproximar-<strong>no</strong>s da representaçãoque se faz <strong>do</strong> índio nas religiões afro--brasileiras: o corpo em movimento,arma<strong>do</strong>com machadinha ou com arcos e flechas,indica sua personalidade forte quesubjuga a natureza ou resiste heroicamenteao coloniza<strong>do</strong>r português. A posição deluta <strong>no</strong>s leva aos <strong>do</strong>mínios <strong>do</strong> caboclo: amata virgem. Conhece<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s seus mistérios,o caboclo é caça<strong>do</strong>r. Altivo, é rei,chefe, autoridade e autoritário - o pajé. Oscaboclos sempre vêem a<strong>do</strong>rna<strong>do</strong>s com cocares,plumas, braceletes. As vezes, ao la<strong>do</strong>de uma cabocla, um animal, de preferênciaum vea<strong>do</strong>.A loja, evidentemente, não configuraum lugar propriamente "sagra<strong>do</strong>", mas refleteo dinâmico diálogo estebeleci<strong>do</strong> entreas religiões afro-brasileiras. com forteapelo mágico e ritual, e a cidade moderna(o terreiro enfrentaria sérias dificuldadespara se estabelecer na cidade se nãopudesse contar com um "entreposto" de artigoslitúrgicos para as suas práticas rituais)(Gonçalves da Silva, 1992). Daí ser frequenteobservarmos diante das estátuas<strong>do</strong>s caboclos - e também de outras entidades- oferendas em dinheiro, feita por religiososou não, que ali mesmo na loja realizampreces e pedi<strong>do</strong>s. Fora <strong>do</strong> terreiro, eportanto longe <strong>do</strong> espaço sagra<strong>do</strong>, a imagemnão perde a força ritual: na estátuao povo vê aquele caboclo que nas festas,toques e sessões feitas em sua homenagem."baixa" para trabalhar para oshomens 4 .Assim, as imagens (muitas vezes consideradasde "mau gosto" pelos pesquisa<strong>do</strong>res)estão longe de configurar-se tão somentenuma apropriação da indústria demassa de uma imagem de caráter religioso.Ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s caboclos produzi<strong>do</strong>s emsérie pelas fábricas de imagens religiosas,Caboclo JuncoVerde incorpora<strong>do</strong>em Pai Doda deOssaim, <strong>no</strong> terreirollê Axé OssaimDarê. Foto LufsGrupioni.
temos àquelas feitas sob encomenda segun<strong>do</strong>a descrição <strong>do</strong> fiel para quem o espírito<strong>do</strong> caboclo teria se manifesta<strong>do</strong> sobaquelas características. Aliás, a autoridadede um pai-de-santo com relação ao caboclose dá muitas vezes a partir de apariçõesoníricas ou em visões."Quem a fez 5 , <strong>do</strong>na?-Ninguém. - o tom era cauteloso - o sr.sabe que nós, as mães caboclas, não somostocadas por mão humana. Quem mefez foi o espírito de um índio que veio amim em sonho. Ele morreu há centenasde a<strong>no</strong>s e é o meu anjo-da-guarda." (Diálogoentre E. Carneiro em uma mãe-de--santo de can<strong>do</strong>mblé de caboclo, apudLandes, 1967: 178)Diante das estátuas, ou em simples oferendasaos caboclos, as velas são verdese amarelas, cores com as quais se enfeitamos terreiros <strong>no</strong>s dias de toques e festasdedica<strong>do</strong>s a esta entidade. Muitas vezes,os barracões são decora<strong>do</strong>s combandeiras <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>, indican<strong>do</strong> o caráter nacional<strong>do</strong> caboclo em contraposição aosorixás africa<strong>no</strong>s.No barracão constróem-se verdadeiras"malocas" de índios, com muito verde eplantas ao re<strong>do</strong>r. Ao caboclo são oferecidasfrutas em grande quantidade, carne,crua ou assada, e mel.Quan<strong>do</strong> "baixam", os caboclos sãoágeis e autoritários: exigem bebidas - emgeral vinho ou cerveja - e charutos . Enfeita<strong>do</strong>scom as insígnias características decada caboclo - Pena Branca, um cocarbranco, Junco Verde, penas azuis e verdes,etc. - arcos e flechas, lanças e facões, oscaboclos bailam. O público, anima<strong>do</strong>, cantae bate palmas, acompanhan<strong>do</strong> a festa. Asmúsicas são em português, às vezes entrecortadaspor palavras em banto e em "línguaindígena"; os atabaques são toca<strong>do</strong>scom as mãos, toque próprio da umbandae <strong>do</strong>s can<strong>do</strong>mblés da nação angola.Após a vigorosa e alegre dança, os caboclosse retiram para algumas partes <strong>do</strong>barracão. A assistência (os consulentes) fazfilas para consultar aquele de sua preferência.As pessoas narram aos caboclos suasaflições e penas, pedem ajuda e conselhos.Muitas vezes é necessário um "cambo<strong>no</strong>"- auxiliar <strong>do</strong> culto que se encarrega de a<strong>no</strong>taras receitas e traduzir palavras <strong>do</strong>s caboclose outras entidades para os consulentes.O "cambo<strong>no</strong>" a<strong>no</strong>ta o <strong>no</strong>me <strong>do</strong>consulente e de familiares e amigos em peque<strong>no</strong>spapéis que entrega ao caboclo. Ocaboclo localiza o mal e interpreta o sofrimento<strong>do</strong> povo; receita ervas, pois conheceas matas e os seus segre<strong>do</strong>s. Às vezes sezanga com o consulente, que há muito jáconhece, quan<strong>do</strong> este não age de acor<strong>do</strong>com as suas prescrições.Muitas vezes, as festas de caboclo <strong>do</strong>scan<strong>do</strong>mblés de angola começam com o climareligioso de qualquer can<strong>do</strong>mblé. Aalegria <strong>do</strong>s caboclos, que interpelam o públicoconvidan<strong>do</strong> o povo para dançar, fazcom que pouco a pouco a festa sagradase transforme numa festa profana: as músicasreligiosas são substituídas pelas cantigasde "sotaque" - cantigas maliciosas eprovocativas - e depois por uma roda-de--samba (Amaral, 1992).Nos dias dedica<strong>do</strong>s ao orixá Oxóssi -orixá caça<strong>do</strong>r e <strong>do</strong><strong>no</strong> das matas, protetorde to<strong>do</strong>s os que habitam a floresta -, osadeptos da umbanda, sobretu<strong>do</strong>, mas tambémalguns terreiros de can<strong>do</strong>mblé, se retirampara os arre<strong>do</strong>res da cidade, onde encontramáreas verdes e cachoeiras. Nestedia, os umbandistas tocam para Oxóssi, eos caboclos incorporam. As identificaçõesentre o deus caça<strong>do</strong>r e os caboclos sãomuitas: ambos são conhece<strong>do</strong>res das matase das ervas, são caça<strong>do</strong>res e usam arcoe flecha. A diferença, segun<strong>do</strong> os mitos,está em que Oxóssi aprendeu aconhecer as ervas com Catandê (Ossaim),outro orixá; os caboclos, índios brasileiros,nascem saben<strong>do</strong> o segre<strong>do</strong> (Santos, 1992).Na mata o povo toca atabaques, os caboclosincorporam e se vestem com as insígniascaracterísticas. O povo saúda: "Oké,caboclo!", "Xeto, marromba, xeto!". Os caboclosgritam e cumprimentam a assistência.Muito <strong>do</strong> gestual <strong>do</strong>s caboclos sãoidênticos ao <strong>do</strong>s filhos de Oxóssi, que incorporamo seu deus <strong>no</strong>s terreiros de can<strong>do</strong>mblé:ao cumprimentar a assistência, securvam e "gritam" como pássaros 6 .Belas oferendas são feitas às entidadesdas matas: frutas das mais diversas qualidades,melões, melancias, cocos, bananase abóboras, flores e mel; oferecem-lhes be-
- Page 2 and 3:
ÍNDIOS NO BRASIL
- Page 4 and 5:
"índios no Brasil" é uma publica
- Page 6 and 7:
ÍNDIOS NO BRASILCom a chegada das
- Page 8 and 9:
ÍNDICEOS ÍNDIOS E A SECRETARIA MU
- Page 10 and 11:
A Severo Gomes,amigo dos índios
- Page 12 and 13:
500 Anos - Caminhos da Memória,Tri
- Page 14 and 15:
As sociedades indígenas no Brasil
- Page 16 and 17:
elaboradas nesse processo de contat
- Page 18 and 19:
índio Xavante fala -durante ainaug
- Page 20 and 21:
De todos esses critérios o que sob
- Page 22 and 23:
A nominação,iniciação e morte d
- Page 24 and 25:
conhecidas e estão sendo investiga
- Page 26 and 27:
Crianças participamda conversa com
- Page 28 and 29:
questão indígena no Brasil, mimeo
- Page 30 and 31:
Primeira reunião detrabalho daComi
- Page 32 and 33:
O presidente daFUNAI, SidneyPossuel
- Page 34 and 35:
Marcos Terena.Orlando Baré eKarai-
- Page 36 and 37:
cipais entidades e especialistas, o
- Page 38 and 39:
Cartas brasileiras:visão c revisã
- Page 40 and 41:
tos sobre a terra brasileira. Algun
- Page 42 and 43:
llustTação do livro"Vida do após
- Page 44 and 45:
totalmente, esta gente vai estabele
- Page 46 and 47:
A lógica das imagens e os habitant
- Page 48 and 49:
Coabitam no mesmo quadro diversasor
- Page 50 and 51:
se modo, o índio passa a ser mostr
- Page 52 and 53:
corda, quando desejam lhe tirar a b
- Page 54 and 55:
movimentação dos índios é enfim
- Page 56 and 57:
nação da parte do corpo-alimento
- Page 58 and 59:
Caminha relata em sua carta ao rei
- Page 60 and 61:
Atualmente existemapenas 6exemplare
- Page 62 and 63:
Era hábito no reinado de Dom João
- Page 64 and 65:
Mais de 3.000artefatos dos fndiosBo
- Page 66 and 67:
Imagem e representação do índion
- Page 68 and 69:
um determinado saber cultural e seu
- Page 70 and 71:
entre os quais, além de curiosos d
- Page 72 and 73:
corrente tema das "descobertas", pr
- Page 74 and 75:
do versões mais distanciadas da re
- Page 76 and 77:
de dos habitantes da terra, cenas g
- Page 78 and 79:
de construção da pessoa" (p.13).C
- Page 80 and 81:
DIVERSIDADE CULTURAL DAS SOCIEDADES
- Page 82 and 83:
Na mitologia dosíndios Desana, aav
- Page 84 and 85:
vive-se. Na morte, a ruptura quase
- Page 86 and 87:
seres humanos, plantas e animais, c
- Page 88 and 89:
versificadas as imagens que dão co
- Page 90 and 91:
de outras expressões humanas, comp
- Page 92 and 93:
Motivos ukuktop:a) Kotkotoró uputp
- Page 94 and 95:
Motivos da metade"vermelha"1 - Clã
- Page 96 and 97:
Motivos da metade"branco"7- Clã Bu
- Page 98 and 99:
Línguas indígenas no Brasilcontem
- Page 100 and 101:
Os estudos e conclusões sobre o In
- Page 102:
das 21 línguas Karib, o maior núm
- Page 108 and 109:
Mato Grosso, também isoladas dentr
- Page 110 and 111:
O escravo índio, esse desconhecido
- Page 112 and 113:
aliás ocorrido seis anos antes. Se
- Page 114 and 115:
vilegiando a composição de expedi
- Page 116 and 117:
da pelo índio no esquema produtivo
- Page 118 and 119:
"índia Guaranicivilizada a caminho
- Page 120 and 121:
piorar o trabalho nativo. O resulta
- Page 122 and 123:
De fato, no início do século XVII
- Page 124 and 125:
vos da terra: "O Estado [do Maranh
- Page 126 and 127:
De arredio a isolado:perspectivas d
- Page 128 and 129:
laciosa a ideia do isolamento. Sabe
- Page 130 and 131:
ceram do mapa. Mas é preciso ter c
- Page 132 and 133:
ços que nos parecem genuinamente "
- Page 134 and 135:
tos ou indivíduos do grupo. A comp
- Page 136 and 137:
Sair do isolamento: uma políticade
- Page 138 and 139:
4. Ver o estudo de Farage sobre a i
- Page 140 and 141:
As artes da vida do indígena brasi
- Page 142 and 143:
do o cuidado o combustível para o
- Page 144 and 145:
fuso um movimento de rotação. (Cf
- Page 146 and 147:
são atualmente os índios Kaapor e
- Page 148 and 149:
índios Waiãpidurante o ritual do"
- Page 150 and 151:
Os índios e suas relações com a
- Page 152 and 153:
vos. Dois autores compartilham dest
- Page 154 and 155:
A construção simbólica da nature
- Page 156 and 157:
um xamã e de sua relação com o d
- Page 158 and 159:
O direito envergonhado:o direito e
- Page 160 and 161: Brasil" 4 , descarta a possibilidad
- Page 162 and 163: Manuela Carneiro da Cunha, em brilh
- Page 164 and 165: Ailton Krenak pintaseu rosto durant
- Page 166 and 167: voltura das terras públicas e das
- Page 168 and 169: civilização, garantem aos "infest
- Page 170 and 171: nista oficial, praticamente sem int
- Page 172 and 173: os direitos originários sobre as t
- Page 174 and 175: "Homem Camacan-Mongoio" e "MulherCa
- Page 176 and 177: O amor trágico e infeliz de uma í
- Page 178 and 179: No início dos anos 40, Cândido Po
- Page 182 and 183: ÍNDIOS DO PRESENTE E DO FUTURO
- Page 184 and 185: O índio e a modernidadeWashingtonN
- Page 186 and 187: A ignorância inicial desse sistema
- Page 188 and 189: pécies como partes integrantes das
- Page 190 and 191: Já no neolítico, diz ele, estava
- Page 192 and 193: para os índios, era boa para o tea
- Page 194 and 195: preconceitos na relação entre "ci
- Page 196 and 197: As terras indígenas no BrasilLux B
- Page 198 and 199: índios assistem avotação do cap
- Page 200 and 201: pulação do país (o Brasil conta
- Page 202 and 203: tidades, tomaram a iniciativa de pr
- Page 204 and 205: Extensão das terras do país: 850
- Page 206 and 207: fesas frente a estas investidas pre
- Page 208 and 209: "Xeto, marromba, xeto!" -a represen
- Page 212 and 213: idas e charutos, a alegria das dan
- Page 214 and 215: Caboclos dançamno terreiro llê Ax
- Page 216 and 217: ê, em Pirituba, São Paulo) guarda
- Page 218 and 219: 5. "Fazer no santo" significa um co
- Page 220 and 221: Amazónia, Amazónia:não os abando
- Page 222 and 223: Entre os dois tipos de invasores es
- Page 224 and 225: oeste de Mato Grosso. Regina Valad
- Page 226 and 227: que sejam postos em perigo os direi
- Page 228 and 229: A retirada ilegal demadeiras em ár
- Page 230 and 231: Imprensa e questão indígena:rela
- Page 232 and 233: um simples cantor como Sting pareci
- Page 234 and 235: CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO ÍNDIOS NO
- Page 236 and 237: Albert Eckhout (1610- 1665)"O pinto
- Page 238 and 239: Livro: WALLACE, Alfred Russel. Anar
- Page 240 and 241: 7. Apiacás com ornamentos, 1828,aq
- Page 242 and 243: 2. Chef de Gouaycourous partantpour
- Page 244 and 245: 19. índias, desenho a nanquim bico
- Page 246 and 247: Pedro II aceitou com prazer a dedic
- Page 248 and 249: 2. Comei-vos uns aos outros, grafit
- Page 250 and 251: cias indígenas, acompanhados de al
- Page 252: Sala dos Mantos Tupinambá1000 cruz
- Page 256 and 257: Reprodução de uma casa de farinha
- Page 258 and 259: Fotografias de índios ampliadas ab
- Page 260 and 261:
índios da aldeia Morro da Saudade
- Page 262 and 263:
no e cosmógrafo do rei, em 1555. F
- Page 264 and 265:
te, Canela, Yanomami, Wayana-Apalai
- Page 266 and 267:
to: Isaac Amorim Filho), Pataxo Hã
- Page 268 and 269:
os mortos, com os animais, com os i
- Page 270 and 271:
Padrinho tocando trompete e garotoi
- Page 272 and 273:
Classificação das aves: o etnocon
- Page 274 and 275:
formação. Na transposição dos r
- Page 276 and 277:
Promulgada em 05 de outubro de1988,
- Page 278 and 279:
Garimpo cm áreas indígenas: ocaso
- Page 280 and 281:
"O Museu do Centro Maguta é import
- Page 282 and 283:
Bonecos Waiãpi e Bororó: Anésia
- Page 284 and 285:
SOBRE OS AUTORESAna Maria de M. Bel
- Page 286 and 287:
evistas especializadas e jornais.
- Page 288:
Mudjetíre. Asurini do Xingu e Para