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Lançamento do livro "História dos índios no Brasil

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O índio e a modernidadeWashingtonNovaesÉ preciso começar com uma advertência:o que se vai ver aqui não é, nem pretendeser, uma visão científica da questão<strong>do</strong> índio diante da modernidade. Não éuma visão das chamadas ciências sociais.E apenas o relato despretensioso de quem,por força da atividade como jornalista, como<strong>do</strong>cumentarista, teve o privilégio daconvivência com alguns grupos indígenasna Amazónia, <strong>no</strong> Centro-Oeste e <strong>no</strong> Sul<strong>do</strong> país, alguns deles ainda na força de suacultura, antes <strong>do</strong> massacre determina<strong>do</strong>pela convivência forçada com outrasculturas.Ao fim de muitos a<strong>no</strong>s de convivênciae observação, resta a convicção muito fortede que nas culturas indígenas se encontrammuitos traços, muitas direções, deuma verdadeira modernidade.Não significa que se proponha um retor<strong>no</strong>coletivo à condição de índios - nemteríamos competências para isso. Significaque o encontro de uma verdadeira modernidade,<strong>no</strong> caso brasileiro, exige a reincorporaçãode muitos mo<strong>do</strong>s de ser e deviver encontráveis nas culturas indígenas,da organização política à organização sociale ao relacionamento com o meio ambiente.Tal reencontro, além <strong>do</strong> mais, <strong>no</strong>spermitiria valorizar, realçar, desfrutar de<strong>no</strong>ssa incomparável diversidade cultural -temos ainda umas 150 culturas -, hoje desprezadae esmagada, e da <strong>no</strong>ssa diversidadebiológica.Poderíamos, se caminharmos nessa direção,escapar às visões que a maioria dasociedade brasileira tem hoje <strong>do</strong> índio. Umaparte <strong>do</strong>s brasileiros sequer entende ou admiteque se demarquem terras indígenase se cogite da preservação <strong>do</strong>s grupos, sobo argumento de que se trata de indivíduosimprodutivos, obstáculos ao "progresso" ouao "desenvolvimento", numa hora em quetantas pessoas vivem na miséria. Outra parte,numa visão condescendente, admite ademarcação, embora aqui e ali invoque anecessidade de "compatibilizar" a preservaçãocom outros interesses nacionais, sejameles o "desenvolvimento", a manutençãoda soberania ou "um limite de terra poríndio". Uma terceira parcela de brasileiros,mi<strong>no</strong>ritária, defende a demarcação dasáreas indígenas como um direito constitucional,ao mesmo tempo em que proclamao direito <strong>do</strong>s indígenas à existência eà diferença cultural.Quanto à primeira visão, não é difícillembrar que transfere para o índio a responsabilidadepor injustiças sociais que devemser localizadas em outros grupos sociais- pois essa visão não contesta nenhumoutro tipo de propriedade de terras, sejaqual for a extensão ou a utilização <strong>do</strong> património.A segunda visão também não resistea confronto, na medida em que o argumentoda ressalva só é invoca<strong>do</strong> quan<strong>do</strong>se trata de índios e deslembran<strong>do</strong> que suaposse da terra é imemorial, numa sociedadeque admite até a propriedade porusucapião, após duas décadas de possepor não-índios. E mesmo a visão mais generosa,que proclama o direito à existênciae à diferença cultural, talvez precise sercompletada com outra visão: a <strong>do</strong> direitoà semelhança, lembra<strong>do</strong>, por exemplo, peloprof. Kabengele Munanga, da Universidadede São Paulo, elepróprio um discrimina<strong>do</strong>racial na sua Africa. Diz o prof.Munanga que o racista agride e mata pornão admitir o direito à semelhança, à possibilidadede o discrimina<strong>do</strong> fazer o que ele,racista, é capaz de fazer profissionalmente,à possibilidade de esse discrimina<strong>do</strong>ocupar o lugar dele, racista. Nada mais verdadeiroem relação ao índio: é a cobiça porsua terra e pelo que nela se encontra queexplica a negação de seus direitos, da mesmaforma que em outros tempos foi o desejode transformá-lo em escravo, de apropriação<strong>do</strong> seu trabalho. E a tal ponto quefoi preciso um papa proclamar que índiotambém tinha alma para negar o "direito"de morte sobre ele.Será indispensável, entretanto, que asociedade brasileira - para mudar sua visão-, além de ser informada corretamentesobre a questão indígena e os direitos<strong>do</strong>s 250 mil índios remanescentes, tome

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