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Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev

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— Um cavalheiro. Não disse o nome. Está esperando lá embaixo.<br />

Meu pai? Meu irmão? O pintor? O pintor... Senti meu rosto ruborizar e<br />

levantei-me rapidamente.<br />

— Conduza-o à sala.<br />

Ele estava em pé à janela, olhando para o outro lado da rua estreita, para a<br />

torre em frente. Não nos víamos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a noite na véspera <strong>de</strong> meu casamento, e<br />

se minha mente chegou a pensar nele <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, eu o tinha apagado com tanta<br />

firmeza quanto as velas do altar eram extintas <strong>de</strong>pois da missa. Mas agora, <strong>de</strong><br />

novo em sua presença, senti-me estremecer quando se virou para mim. Não<br />

parecia bem. Tinha voltado a emagrecer e sua tez, sempre pálida, estava da cor<br />

<strong>de</strong> queijo <strong>de</strong> cabra, e estava com olheiras. Suas mãos estavam escuras,<br />

manchadas <strong>de</strong> tinta, e vi que segurava um rolo <strong>de</strong> papéis envolvido em<br />

musselina. Meus <strong>de</strong>senhos. Tive dificulda<strong>de</strong> em respirar.<br />

— Seja bem-vindo — eu disse, instalando-me cuidadosamente em uma<br />

das ca<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> meu marido. — Quer sentar-se?<br />

Emitiu um b<strong>rev</strong>e ruído, que interpretei como uma recusa, já que<br />

permaneceu em pé. O que fazia com que nós dois ficássemos tão nervosos<br />

quando juntos, cada um mais acanhado do que o outro? O que Erila tinha me<br />

dito certa vez sobre os perigos da inocência serem mais graves do que os do<br />

conhecimento? Exceto, certamente, que eu <strong>de</strong>ixara <strong>de</strong> ser inocente. E quando<br />

pensei nas entranhas do homem estripado em seus esboços noturnos, percebi<br />

que, <strong>de</strong> uma maneira ou <strong>de</strong> outra, ele também já não o era.<br />

— É casada — disse, por fim, sua timi<strong>de</strong>z, <strong>de</strong> certa forma rabugenta, <strong>de</strong><br />

volta como escudo.<br />

— Sim, sou.<br />

— Nesse caso, espero não incomodá-la.<br />

Sacudi os ombros.<br />

— Por que incomodaria? Agora, meu tempo é meu. — Mas não consegui<br />

tirar os olhos do rolo em sua mão. — Como está a capela? Já começou?<br />

Ele assentiu com a cabeça.<br />

— E? Está indo bem?<br />

Gaguejou alguma coisa que não ouvi direito. Depois disse:<br />

— Eu... eu trouxe os <strong>de</strong>senhos — e esten<strong>de</strong>u-os, <strong>de</strong>sajeitadamente.<br />

Quando estendi minha mão para pegá-los, senti que tremia ligeiramente...<br />

— Você os viu?<br />

Ele anuiu com um movimento da cabeça.<br />

— E?<br />

— Entenda, não sou um juiz... mas acho... acho que tanto seu olhar quanto<br />

sua pena anseiam pela verda<strong>de</strong>.<br />

Tive um sobressalto, e apesar <strong>de</strong> saber que é uma blasfêmia, senti-me, por

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