Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev
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ochechas encovadas, porém, estranhamente, seus lábios permaneciam cheios.<br />
Eu podia traçar o subir e <strong>de</strong>scer <strong>de</strong> seus pulmões pelo calor <strong>de</strong> seu hálito em<br />
minha face. Erila e Filippo tinham feito um bom trabalho: a sua pele cheirava a<br />
camomila e outras ervas, e seu hálito tinha o cheiro forte do vinho doce. Olhei<br />
seus lábios. Meu marido tinha-me beijado na bochecha um dia, à porta do meu<br />
quarto. Tinha sido o único beijo que eu sentira, em minha vida, <strong>de</strong> um homem.<br />
Eu seria penetrada até produzir um her<strong>de</strong>iro, mas no que dizia respeito a ternura<br />
e paixão, eu permaneceria virgem. Ou, citando meu marido, o meu prazer seria<br />
problema só meu.<br />
Curvei-me e aproximei meu rosto do <strong>de</strong>le. Seu hálito atingiu-me em ondas<br />
doces e quentes. Dessa vez, a proximida<strong>de</strong> <strong>de</strong>le não me fez tremer. Em vez<br />
disso, tornou-me audaciosa. Seu corpo estava tão ressequido que pu<strong>de</strong> perceber<br />
rachaduras na superfície <strong>de</strong> sua pele. Pus meus <strong>de</strong>dos na boca para molhá-los.<br />
Minha saliva era quente e secreta, uma transgressão em si mesma. Passei a ponta<br />
<strong>de</strong> meus <strong>de</strong>dos molhados levemente em seus lábios. Tocá-lo provocou um<br />
choque agudo lá <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim, mas palpitante, como a sensação ao <strong>de</strong>scobrir<br />
meu machucado interior. Eu podia ouvir meu coração pulsando em meus<br />
ouvidos, como na tar<strong>de</strong> em que procurara Deus nos raios <strong>de</strong> sol e não O<br />
encontrara. Nem todo calor encerrava uma <strong>rev</strong>elação. Algumas tem-se <strong>de</strong> achar<br />
sozinho. Movi meus <strong>de</strong>dos <strong>de</strong> seu rosto para o seu peito. A túnica que tinham<br />
encontrado para ele era gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>mais para seu corpo emaciado e seus ombros<br />
estavam expostos. A ponta do meu <strong>de</strong>do era o mais fino dos pincéis. Lembro-me<br />
da hilarida<strong>de</strong> da linha brilhante <strong>de</strong> meu próprio sangue naquela noite, no escuro,<br />
e imaginei cores fluindo <strong>de</strong> mim para ele, a sua pele transformando-se em<br />
rastros <strong>de</strong> azul índigo ou açafrão selvagem sob o meu <strong>de</strong>do. Sua pele estava<br />
quente. Murmurou ao meu toque, agitando-se em seu sono. Meus <strong>de</strong>dos<br />
pararam, pairaram incertos, <strong>de</strong>pois se moveram <strong>de</strong> novo. O açafrão tornou-se<br />
ocre vivo, <strong>de</strong>pois púrpura escura. Logo ele estaria coberto <strong>de</strong> cores.<br />
Cheguei minha boca para perto da sua. E para que não tenham dúvidas,<br />
<strong>de</strong>vo dizer que sabia perfeitamente o que estava fazendo. Com isso quero dizer<br />
que o fazer e eu éramos um só. E não tive medo. Meus lábios encontraram os<br />
seus, e sua sensualida<strong>de</strong> me fez <strong>rev</strong>olver por <strong>de</strong>ntro. Senti ele se agitar contra<br />
meu corpo e reprimir um gemido quando sua boca abriu e encontrou minha<br />
língua.<br />
Seu corpo estava tão magro que era como se eu segurasse uma criança.<br />
Meu <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong>rramou-se sobre ele e quando nossos torsos se comprimiram, senti<br />
seu sexo erguer-se contra minha coxa. Em algum lugar em mim, uma centelha<br />
acen<strong>de</strong>u-se e foi se intensificando. Tentei engolir, mas não havia saliva<br />
suficiente. A minha vida inteira estava presente no fôlego que agora eu<br />
começara a tomar. Depois <strong>de</strong> ter o ar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim o que faria com ele? Eu o