Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev
Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev
Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
modo a ficar realmente perto para ser tocado, perto o bastante para eu ver a<br />
película <strong>de</strong> suor e óleo sobre a sua pele, e sentir o cheiro rançoso <strong>de</strong> seu corpo.<br />
— Primeiro corta-se a pele, pequenos cortes, snip, snip, snip, <strong>de</strong>pois, um por<br />
um, fura-se nas cores.<br />
— Oh, dói?<br />
— Bem... Gritei como um bebê — replicou ele. — Mas uma vez iniciado,<br />
não os faria parar. E, assim, a minha serpente fica mais bonita e graciosa a cada<br />
dia. A serpente Diabo tem um rosto <strong>de</strong> mulher, sabia? Para tentar os homens. Na<br />
próxima vez que entrar na faca, vou pedir que lhe dêem as suas feições.<br />
— Arch! — A voz <strong>de</strong> Erila, agredindo com <strong>de</strong>sdém. — Não dê atenção.<br />
Ele só quer outra moeda.<br />
Mas a afastei.<br />
— Sei quem fez isso — disse eu rapidamente. — Foram os tintureiros <strong>de</strong><br />
Santa Croce. Você foi um <strong>de</strong>les, não foi?<br />
— Fui — respon<strong>de</strong>u ele, e me olhou mais atentamente. — Como soube<br />
disso?<br />
— Vi os padrões em suas peles. Fui lá, uma vez, quando era criança.<br />
— Com o seu pai. O mercador <strong>de</strong> panos — disse ele.<br />
— Sim! Sim!<br />
— Agora me lembro. Era pequena e mandona e metia o nariz em tudo.<br />
Ri alto.<br />
— Isso mesmo! Realmente se lembra <strong>de</strong> mim!<br />
Erila, impaciente, falou alto:<br />
— Já lhe tirei a bolsa, seu cabeça-dura. Não conseguirá mais moedas.<br />
— Não preciso do seu dinheiro — resmungou. — Ganho mais agitando<br />
meus braços do que você nas ruas, <strong>de</strong>pois que escurece, quando não se tem<br />
como distinguir sua cor do escuro da noite. — E voltou a atenção para mim. —<br />
Sim, agora me lembro. Lembro-me <strong>de</strong> que usava roupas elegantes e <strong>de</strong>ssa cara<br />
feia amassada... mas ainda assim, não tinha medo <strong>de</strong> nada.<br />
Registrei suas palavras como uma pequena punhalada. Devo ter recuado,<br />
mas sua cara se aproximou.<br />
— Mas vou lhe dizer uma coisa. Eu não a achei feia. Não, <strong>de</strong> jeito<br />
nenhum. Achei-a bastante sensual. — E ao dizer isso, fez a serpente on<strong>de</strong>ar<br />
languidamente na minha direção, ao mesmo tempo passando a língua nos lábios<br />
até a ponta se projetar e sacudir para mim. Foi um gesto lascivo tão flagrante<br />
que senti meu estômago virar com repugnância. Afastei-me rapidamente e abri<br />
caminho até Erila, que já estava fora do ajuntamento, enquanto ouvia a sua<br />
gargalhada grosseira ressoando acima <strong>de</strong> minha cabeça.<br />
Ela estava tão irritada com a minha <strong>de</strong>sobediência que, por alguns<br />
instantes, não falou comigo. Mas quando a multidão diminuiu, parou e virou-se