15.04.2013 Views

Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev

Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev

Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

continha, assumiu a tarefa <strong>de</strong> provi<strong>de</strong>nciar para que eu me casasse, e assim<br />

evitar riscos futuros. Mas nem mesmo ele teve o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> impedir que eu<br />

voltasse.<br />

"Lorenzo e a sua corte passaram o começo do verão <strong>de</strong> 1478 em sua vila<br />

em Careggi. Fui um dos poucos visitantes convidados... Foi há muito tempo.<br />

Interrompeu-se <strong>de</strong> novo, e, por um momento, achei que não fosse<br />

prosseguir, que havia se treinado, <strong>de</strong> fato, para esquecer o que acontecera. Ela<br />

respirou fundo.<br />

— Havia música, conversa, arte e natureza... só os jardins já eram como<br />

um paraíso terreno. A beleza do corpo era tanto um assunto <strong>de</strong> discussão quanto<br />

a beleza da mente. As duas belezas eram vistas como alpondras no caminho para<br />

o amor <strong>de</strong> Deus. Não fui criada para ser coquete. Eu era tão séria e, <strong>de</strong> certa<br />

maneira, tão inocente quanto você. Mas como você, me impressionava a<br />

inteligência, o estudo e a arte. E apesar <strong>de</strong> eu ter resistido uma vez, nesse verão,<br />

eu estava apaixonada há anos <strong>de</strong>mais para saber como me reprimir.<br />

Vi <strong>de</strong> novo suas lágrimas diante do corpo <strong>de</strong> Lorenzo, na capela <strong>de</strong> San<br />

Marco tanto tempo atrás. Quais tinham sido as palavras <strong>de</strong> Tomaso em meu<br />

ouvido naquele dia? Que apesar <strong>de</strong> sua feiúra, a sua poesia <strong>de</strong> amor podia<br />

inflamar o coração mais gélido. Dei um suspiro, baixando os olhos para o<br />

rostinho radiantemente tranqüilo em meus braços. Era difícil saber o quão<br />

grosso seu nariz seria quando ela crescesse, ou o quanto seu queixo ficaria<br />

pontudo. Sem dúvida, também <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ria <strong>de</strong> seu pai. Quem quer que fosse.<br />

— Bem, pelo menos agora sei porque sou feia — falei calmamente.<br />

— Oh, Alessandra, você não é feia. Você possui uma beleza tal que quase<br />

virou a cabeça <strong>de</strong> um sodomita.<br />

E, é claro, fiquei <strong>de</strong>liciada pela maneira como a palavra causava tanto<br />

prazer em sua transgressão para ela quanto causara para mim. Ficamos sentadas<br />

juntas por um certo tempo, nessa sala <strong>de</strong>sbotada, fora <strong>de</strong> moda, o silêncio da<br />

tar<strong>de</strong> interrompido somente pela respiração doce e rápida <strong>de</strong> minha filha, em paz<br />

por saber que não restava mais nenhum segredo a ser <strong>rev</strong>elado.<br />

— Então — acabei dizendo —, o que vai acontecer agora?<br />

Ela pensou por um momento.<br />

— Você sabe a escolha tanto quanto eu.<br />

— Não vou me casar <strong>de</strong> novo — disse eu com <strong>de</strong>terminação. — Um<br />

segundo casamento privaria minha filha <strong>de</strong> seus direitos, e eu não faria isso.<br />

— É verda<strong>de</strong> — replicou com calma.<br />

— E não posso voltar para casa. Tenho <strong>de</strong> viver a minha própria vida.<br />

Portanto, suponho que <strong>de</strong>vo construir minha casa sozinha.<br />

— Alessandra, acho que não seria sensato. A nossa cida<strong>de</strong> é cruel com as<br />

viúvas. Você e a criança se veriam proscritas, solitárias e rejeitadas.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!