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Sarah Dunant – O Nascimento de Vênus (pdf)(rev

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Seis meses antes, ele seria açoitado por seu <strong>de</strong>sacato, mas hoje, sua<br />

insolência era tão segura que não havia o que replicar. Ao me virar, vi a mesma<br />

cena sendo representada em uma <strong>de</strong>zena <strong>de</strong> pontos nos <strong>de</strong>graus à nossa volta:<br />

cidadãos proeminentes sendo humilhados por essa nova e ru<strong>de</strong> beatice. Era fácil<br />

ver como funcionava: com os ricos sendo tratados com soberba, os pobres<br />

tinham menos razão para venerá-los. E me ocorreu, não pela última vez, que se<br />

esse era realmente o começo da Nova Jerusalém, então cheirava a algo mais do<br />

que uma <strong>rev</strong>olução espiritual.<br />

Meu marido, no entanto, que percebera isso tão claramente quanto eu,<br />

sabiamente optou por não se sentir ofendido. Ao invés disso, virou-se e sorriu<br />

para mim.<br />

— Minha querida esposa — disse ele com um carinho estudado e uma<br />

linguagem frívola. — Vá para casa com Deus e reze por nós. Eu a encontrarei<br />

mais tar<strong>de</strong> e relatarei o que foi dito, se for dito, que a afete.<br />

Fizemos uma <strong>rev</strong>erência e nos separamos como dois atores em uma<br />

versão <strong>de</strong> má qualida<strong>de</strong> dos contos <strong>de</strong> Boccaccio, e ele <strong>de</strong>sapareceu no interior<br />

cavernoso.<br />

Ao pé da escada, Erila e eu nos vimos no meio <strong>de</strong> uma multidão <strong>de</strong> mulheres<br />

divididas entre <strong>de</strong>voção e indignação por sua exclusão. Reconheci algumas que<br />

minha mãe talvez consi<strong>de</strong>rasse suas iguais, mulheres educadas e <strong>de</strong> recursos.<br />

Depois <strong>de</strong> algum tempo, um grupo <strong>de</strong> garotos, o cabelo cortado bem curto e<br />

vestidos mais como penitentes do que adolescentes, surgiram e começaram a nos<br />

arrebanhar e impelir para a orla da praça. Pareceu-me que usavam a <strong>de</strong>sculpa <strong>de</strong><br />

sua santida<strong>de</strong> para nos espicaçar e humilhar como nunca po<strong>de</strong>riam ter feito<br />

antes.<br />

— Por aqui. — Erila agarrou-me e empurrou-me para o lado. — Se<br />

ficarmos aqui, nunca entraremos.<br />

— Mas como po<strong>de</strong>mos? Há guardas em toda parte.<br />

— Sim, mas nem todas as portas são para os ricos. Com sorte, terão<br />

escolhido capangas menos importantes para pessoas menos importantes.<br />

Segui-a para fora da multidão e <strong>de</strong>mos a volta na Catedral até<br />

encontrarmos uma porta em que o fluxo <strong>de</strong> pessoas era menor, mas impelido<br />

com tal força que era impossível para os sacristãos na entrada controlarem todos<br />

os que avançavam para <strong>de</strong>ntro. Ao forçarmos o caminho, ouvimos o som do<br />

interior se avolumar. Parecia que Savonarola tinha aparecido no altar e, <strong>de</strong><br />

repente, a compressão se tornou mais pesada e o impulso mais rápido, quando as<br />

gran<strong>de</strong>s portas da Catedral começaram a se fechar.<br />

Lá <strong>de</strong>ntro, Erila me puxou rapidamente para trás, <strong>de</strong> modo que nos

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