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Evagrio-Pontico-Tratado-Practico-pdf

Evagro pertence a esta categoria de homens – relativamente frequente na história da Igreja – que conheceram um destino contraditório sob mais de um aspecto. De início homem do mundo, torna-se humilde Padre do deserto. Quando vivo, foi tido em grande estima, para depois, muito tempo após sua morte, vir a ser desacreditado. “Pai de nossa literatura espiritual (O. Chadwick), mas cuja obra, ou quase toda ela, não foi logo transmitida senão por meio de traduções ou sob nomes emprestados... Quem então foi este homem?

Evagro pertence a esta categoria de homens – relativamente frequente na história da Igreja – que conheceram um destino contraditório sob mais de um aspecto.
De início homem do mundo, torna-se humilde Padre do deserto. Quando vivo, foi tido em grande estima, para depois, muito tempo após sua morte, vir a ser desacreditado. “Pai de nossa literatura espiritual (O. Chadwick), mas cuja obra, ou quase toda ela, não foi logo transmitida senão por meio de traduções ou sob nomes emprestados... Quem então foi este homem?

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182<br />

CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS<br />

dos Padres da Igreja: ela foi “batizada”. E isto é imediatamente perceptível na<br />

doutrina sobre as virtudes.<br />

Evagro parte das quatro virtudes cardinais dos estóicos: prudência, continência,<br />

coragem e justiça, cujos papéis ele descreve também em Gn., 44, sempre sob a<br />

autoridade de Gregório de Nazianze. Mas estas virtudes estóicas são<br />

enquadradas pelas virtudes mais especificamente cristãs da inteligência e da<br />

sabedoria (cf. Col., I, 9), da caridade e da abstinência (cf. I Tim., II, 15), além da<br />

perseverança (Rom., V, 3). Conforme Evagro aprendeu com Dídimo o Cego,<br />

todas estas virtudes, e mais aquelas que lhes são aparentadas, formam uma<br />

unidade orgânica, que se “refrata” nas facetas de nossa alma como num prisma<br />

e que se dá a ver como as correspondentes virtudes particulares (cf. Pr., 98). O<br />

catálogo proposto aqui está longe de ser completo e, em outros contextos,<br />

Evagro mencionará também outras virtudes.<br />

Como a alma é constituída de uma parte racional e outra irracional (sendo esta<br />

última formada por duas potências), a primeira destinada à contemplação<br />

(theoria), a segunda à praktiké, as virtudes podem se dividir em virtudes<br />

“teóricas” e virtudes “práticas”. A justiça é considerada como a “virtude prática<br />

predominante” que torna os homens “justos” (in Ps., LXXXIV, 14), e também<br />

como a porta da sabedoria (in Prov., XXIV, 7/G.267), sendo esta por sua vez “o<br />

primeiro dom do Espírito Santo” (in Prov., VIII, 10/G.101) e “a primeira de<br />

todas as virtudes” (K.G., VI, 51). Por isso, pode-se dizer da sabedoria – com<br />

seus sinônimos de: conhecimento, inteligência, prudência, etc. (cf. in Prov., VII,<br />

4/G.88) – que ela é a virtude “teórica” (contemplativa) por excelência: embora<br />

Evagro, ao que saibamos, não recorrido a este conceito. É ela, de fato, que dá<br />

acesso ao Deus trinitário, que é em si “conhecimento ilimitado e sabedoria<br />

substancial” (in Ps., CIIIVIII, 7c).<br />

Dentro desta estrutura global, a justiça ocupa uma posição privilegiada: como<br />

um “cabresto” (in Ps., LXI, 10) ela “mantém unidas” (in Ps., XXX, 2) as demais<br />

virtudes, ao mesmo tempo em que lhes serve de “regra” (kanon)(in Ps., XXXVI,<br />

6c). É por isso que o contemplativo, para Evagro, é um “justo” no mais alto<br />

sentido do termo, no sentido bíblico. Inversamente, um “justo”, graças ao seu<br />

conhecimento, é um “sábio”, verdadeiramente um “amigo de Deus” (in Prov.,

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