Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa
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acelerou-se na direção <strong>do</strong> descontrole ela comentou:<br />
”Isto não pode durar. Alg<strong>um</strong>a coisa horrível está por<br />
acontecer”. De mo<strong>do</strong> semelhante, com mais ou menos<br />
insight, o mesmo ocorreu à maioria <strong>do</strong>s outros, como<br />
com Leonard L., quan<strong>do</strong> ele passou da saciedade ao<br />
excesso: sua ”abundância de saúde e energia — de<br />
’graça’, como ele a chamava — tornou-se abundante<br />
demais, começan<strong>do</strong> a ass<strong>um</strong>ir <strong>um</strong>a forma exagerada. A<br />
sensação de harmonia, serenidade e controle sem<br />
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esforço foi substituída por <strong>um</strong>a sensação de demasia<br />
[...] <strong>um</strong> enorme excesso, <strong>um</strong>a enorme pressão de [...]<br />
[to<strong>do</strong> tipo]”, <strong>que</strong> ameaçava desintegrá-lo, fazê-lo em<br />
pedaços.<br />
Essa <strong>é</strong> simultaneamente a dádiva e o tormento, o<br />
prazer e a aflição impostos pelo excesso. E isto <strong>é</strong> visto,<br />
por pacientes perspicazes, como algo <strong>que</strong>stionável e<br />
para<strong>do</strong>xal: ”Tenho energia demais”, disse <strong>um</strong> paciente<br />
com a síndrome de Tourette. ”Tu<strong>do</strong> <strong>é</strong> brilhante demais,<br />
poderoso demais, tu<strong>do</strong> demais. É <strong>um</strong>a energia febril,<br />
<strong>um</strong> esplen<strong>do</strong>r mórbi<strong>do</strong>”.<br />
”Bem-estar perigoso”, ”esplen<strong>do</strong>r mórbi<strong>do</strong>”, <strong>um</strong>a<br />
euforia enganosa com abismos por baixo — essa <strong>é</strong> a<br />
armadilha com <strong>que</strong> o excesso acena e ameaça, seja ela<br />
provocada pela natureza, na forma de alg<strong>um</strong> distúrbio<br />
extasiante, seja por nós mesmos, na forma de alg<strong>um</strong><br />
vício excitante.<br />
Os dilemas h<strong>um</strong>anos, em tais situações, são de <strong>um</strong><br />
tipo extraordinário: pois os pacientes, neste caso, estão<br />
diante da <strong>do</strong>ença como <strong>um</strong>a sedução, algo distante <strong>do</strong><br />
tradicional tema da <strong>do</strong>ença como sofrimento e aflição, e<br />
muito mais enganoso. E ningu<strong>é</strong>m, absolutamente<br />
ningu<strong>é</strong>m, está isento desses bizarrismos, dessas<br />
indignidades. Nos distúrbios <strong>do</strong> excesso pode haver<br />
<strong>um</strong>a esp<strong>é</strong>cie de conluio no qual o eu cada vez mais se<br />
alinha e se identifica com sua <strong>do</strong>ença, de mo<strong>do</strong> <strong>que</strong>, por<br />
fim, ele parece perder toda a sua existência<br />
independente, passan<strong>do</strong> a ser nada al<strong>é</strong>m de <strong>um</strong>