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Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

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Eu precisava refletir, vê-lo de novo — e vê-lo em seu<br />

habitat familiar, em sua casa.<br />

Poucos dias depois, fui à casa <strong>do</strong> dr. P. e esposa,<br />

levan<strong>do</strong> na pasta <strong>um</strong>a partitura <strong>do</strong> Dichterliebe (eu<br />

sabia <strong>que</strong> ele gostava de Sch<strong>um</strong>ann) e <strong>um</strong>a variedade<br />

de objetos para o teste de percepção. A Srª. P. recebe<strong>um</strong>e<br />

em <strong>um</strong> apartamento suntuoso, <strong>que</strong> lembrava a<br />

Berlim <strong>do</strong> fin-de-siècle. Um magnífico Bõsen<strong>do</strong>rfer<br />

antigo <strong>do</strong>minava, imponente, o centro da sala e, por<br />

toda parte, havia estantes de música, instr<strong>um</strong>entos,<br />

partituras... Havia <strong>livro</strong>s, havia quadros, mas a música<br />

era central. O dr. P. entrou, <strong>um</strong> tanto curva<strong>do</strong> e,<br />

perturba<strong>do</strong>, avançou com a mão estendida para o<br />

relógio de pêndulo mas, ouvin<strong>do</strong> minha voz, corrigiu-se<br />

e veio apertar minha mão. Trocamos c<strong>um</strong>primentos e<br />

conversamos <strong>um</strong> pouco sobre os concertos e<br />

apresentações em cartaz. Timidamente, perguntei-lhe<br />

se gostaria de cantar.<br />

”O Dichterlieber, exclamou. ”Mas eu já não consigo ler<br />

partituras. O senhor poderia tocar?“.<br />

26<br />

Eu disse <strong>que</strong> tentaria. Na<strong>que</strong>le esplêndi<strong>do</strong> piano<br />

antigo, at<strong>é</strong> o <strong>que</strong> eu tocava parecia bom, e o dr. P. era<br />

<strong>um</strong> Fischer-Dieskau, i<strong>do</strong>so mas infinitamente<br />

harmonioso, combinan<strong>do</strong> ouvi<strong>do</strong> e voz perfeitos com a<br />

mais penetrante inteligência musical. Era evidente <strong>que</strong><br />

a faculdade de música não o mantinha por caridade.<br />

Os lobos temporais <strong>do</strong> dr. P. estavam obviamente<br />

intactos: ele possuía <strong>um</strong> excelente córtex musical.<br />

Fi<strong>que</strong>i imaginan<strong>do</strong> o <strong>que</strong> poderia estar ocorren<strong>do</strong> em<br />

seus lobos parietal e occipital, especialmente nas áreas<br />

responsáveis pelo processamento visual. Eu trazia<br />

poliedros regulares em meu kit neurológico e decidi<br />

começar com eles.<br />

”O <strong>que</strong> <strong>é</strong> isto?”, perguntei, retiran<strong>do</strong> o primeiro.<br />

”Um cubo, <strong>é</strong> claro.”<br />

”E este?”, indaguei, mostran<strong>do</strong> outro.

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