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Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

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desespero <strong>que</strong> ele não sente) — para William, com sua<br />

manifesta indiferença à relação e realidade atrelada a<br />

<strong>um</strong>a infindável loquacidade, pode não existir coisa<br />

alg<strong>um</strong>a <strong>que</strong> o ”resgate” — suas fabulações, suas<br />

aparições, sua busca fren<strong>é</strong>tica de senti<strong>do</strong>s constituin<strong>do</strong><br />

a barreira suprema a qual<strong>que</strong>r senti<strong>do</strong>.<br />

Para<strong>do</strong>xalmente, pois, o grande <strong>do</strong>m de William para<br />

a fabulação — <strong>que</strong> foi evoca<strong>do</strong> a fim de transpor<br />

continuamente o abismo sempre escancara<strong>do</strong> da<br />

amn<strong>é</strong>sia—<strong>é</strong> tamb<strong>é</strong>m sua ruína. Se ao menos ele<br />

conseguisse ficar quieto por <strong>um</strong> instante; temos a<br />

impressão de <strong>que</strong>, se ao menos ele conseguisse<br />

interromper o palavrório e a algaravia, se ao menos ele<br />

conseguisse abrir mão da enganosa superfície<br />

133<br />

da ilusão — então (ah, então!) a realidade poderia<br />

entrar; algo genuíno, profun<strong>do</strong>, verdadeiro, alg<strong>um</strong><br />

senti<strong>do</strong> poderia penetrar em sua alma.<br />

Pois não <strong>é</strong> só a memória <strong>que</strong> constitui a perda final,<br />

”existencial”, neste caso (embora sua memória esteja<br />

completamente destruída); não <strong>é</strong> apenas a memória<br />

<strong>que</strong> foi tão alterada nele, mas alg<strong>um</strong>a capacidade<br />

essencial de sentir <strong>que</strong> desapareceu; e <strong>é</strong> neste senti<strong>do</strong><br />

<strong>que</strong> ele está ”sem alma”.<br />

Luria designa essa indiferença por ”equalização” — e<br />

às vezes parece considerá-la a suprema patologia, o<br />

destrui<strong>do</strong>r final de qual<strong>que</strong>r mun<strong>do</strong>, qual<strong>que</strong>r eu. Ela<br />

exercia, a meu ver, <strong>um</strong> fascínio horrorizante sobre<br />

Luria, al<strong>é</strong>m de representar o desafio terapêutico<br />

máximo. Ele retomou esse tema inúmeras vezes;<br />

ocasionalmente, em relação à síndrome de Korsakov e<br />

à memória, como em The neuropsychology of memory,<br />

mais freqüentemente, em relação a síndromes <strong>do</strong> lobo<br />

frontal, em especial na obra H<strong>um</strong>an brain and<br />

psychological processes, <strong>que</strong> cont<strong>é</strong>m vários relatos de<br />

casos completos de tais pacientes, absolutamente<br />

comparáveis, em sua terrível coerência e impacto, ao<br />

”homem como mun<strong>do</strong> despedaça<strong>do</strong>” [”The man with a

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