19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

e, portanto, originais. Sua ”visão”, se for possível<br />

visl<strong>um</strong>brá-la, prov<strong>é</strong>m de dentro e parece aborígine. Eles<br />

me parecem, quanto mais os conheço, <strong>um</strong>a esp<strong>é</strong>cie<br />

estranha em nosso meio, singulares, originais,<br />

totalmente volta<strong>do</strong>s para dentro, diferentes <strong>do</strong>s outros.<br />

O autismo já foi considera<strong>do</strong> <strong>um</strong>a esquizofrenia<br />

infantil, por<strong>é</strong>m, fenomenologicamente, ocorre o<br />

inverso. A <strong>que</strong>ixa <strong>do</strong> esquizofrênico <strong>é</strong> sempre de <strong>um</strong>a<br />

”influência” exterior: ele <strong>é</strong> passivo, aproveitam-se dele,<br />

não consegue ser ele mesmo. O autista se <strong>que</strong>ixaria —<br />

caso se <strong>que</strong>ixasse — da ausência de influências, de<br />

isolamento absoluto.<br />

”Nenh<strong>um</strong> homem <strong>é</strong> <strong>um</strong>a ilha, isolada <strong>do</strong> resto”,<br />

escreveu Donne. Mas <strong>é</strong> isso exatamente <strong>que</strong> <strong>é</strong> o<br />

autismo — <strong>um</strong>a ilha, separada <strong>do</strong> continente. No<br />

autismo ”clássico”, <strong>que</strong> <strong>é</strong> manifesto, e com freqüência<br />

total, no terceiro ano de vida, o afastamento se dá tão<br />

ce<strong>do</strong> <strong>que</strong> pode não haver a lembrança <strong>do</strong> continente.<br />

No autismo ”secundário”, como o de Jos<strong>é</strong>, causa<strong>do</strong> por<br />

<strong>do</strong>ença cerebral em <strong>um</strong>a fase mais adiantada da vida,<br />

existe alg<strong>um</strong>a lembrança, talvez alg<strong>um</strong>a saudade <strong>do</strong><br />

continente. Isso pode explicar por <strong>que</strong> Jos<strong>é</strong> era mais<br />

acessível <strong>do</strong> <strong>que</strong> a maioria e por <strong>que</strong>, pelo menos<br />

quan<strong>do</strong> desenha, ele <strong>é</strong> capaz de mostrar a ocorrência<br />

de <strong>um</strong>a interação.<br />

Ser <strong>um</strong>a ilha, estar isola<strong>do</strong>, será necessariamente<br />

<strong>um</strong>a esp<strong>é</strong>cie de morte? Pode ser, mas não<br />

necessariamente. Pois, embora as conexões<br />

”horizontais” com os outros, com a sociedade e a<br />

cultura, sejam perdidas, ainda assim pode haver<br />

conexões ”verticais”, vitais e intensificadas, conexões<br />

diretas com a natureza, com a realidade, não<br />

influenciadas, não mediadas, intocadas por outras<br />

pessoas. Esse contato ”vertical” <strong>é</strong> muito patente em<br />

Jos<strong>é</strong>, o <strong>que</strong> explica o caráter penetrantemente direto, a<br />

clareza absoluta de suas percepções e<br />

253<br />

desenhos, sem o menor sinal de ambigüidade ou

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!