19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

das enormes deficiências em todas as capacidades<br />

es<strong>que</strong>máticas — ela não era capaz de calcular o troco,<br />

de fazer os cálculos mais simples, não conseguia<br />

aprender a ler ou escrever e sua m<strong>é</strong>dia em testes de Qi<br />

jamais ultrapassava sessenta (embora se saísse<br />

notavelmente melhor nas partes verbais <strong>do</strong> <strong>que</strong> nas de<br />

execução <strong>do</strong> teste).<br />

Assim, ela era ”d<strong>é</strong>bil mental”, ”tola”, estúpida”, ou<br />

parecera ser, e assim fora chamada, durante toda a sua<br />

vida, por<strong>é</strong>m possuía <strong>um</strong>a capacidade po<strong>é</strong>tica<br />

inesperada, estranhamente comovente.<br />

Superficialmente, ela era <strong>um</strong> amontoa<strong>do</strong> de<br />

incapacidades e<br />

200<br />

deficiências, com as intensas frustrações e ansiedades<br />

<strong>que</strong> as acompanham; nesse nível ela era, e sentia <strong>que</strong><br />

era, <strong>um</strong>a deficiente mental -— não dispon<strong>do</strong> das<br />

habilidades sem esforço, das afortunadas capacidades<br />

das outras pessoas; mas em alg<strong>um</strong> nível mais profun<strong>do</strong><br />

não havia a sensação de invalidez ou incapacidade, mas<br />

<strong>um</strong> sentimento de calma e integridade, de estar<br />

plenamente viva, de ser <strong>um</strong>a alma profunda e sublime,<br />

e igual a todas as demais. Intelectualmente, portanto,<br />

Rebecca sentia-se deficiente; espiritualmente, sentia-se<br />

<strong>um</strong> ser rico e completo.<br />

Quan<strong>do</strong> a encontrei pela primeira vez — desajeitada,<br />

desengonçada, atrapalhadíssima — eu a vi meramente,<br />

ou inteiramente, como <strong>um</strong>a perda, <strong>um</strong>a criatura<br />

arruinada cujos problemas neurológicos eu podia<br />

detectar e dissecar com precisão; <strong>um</strong>a infinidade de<br />

apraxias e agnosias, <strong>um</strong> amontoa<strong>do</strong> de danos e<br />

esgotamentos sensório-motores, limitações <strong>do</strong>s<br />

es<strong>que</strong>mas e conceitos intelectuais, semelhantes (pelos<br />

crit<strong>é</strong>rios de Piaget) às de <strong>um</strong>a criança de oito anos.<br />

Uma infeliz, pensei comigo, talvez com <strong>um</strong>a habilidade<br />

única, <strong>um</strong>a aberração, <strong>um</strong> inespera<strong>do</strong> <strong>do</strong>m, o da fala;<br />

<strong>um</strong> simples mosaico de funções corticais superiores,<br />

es<strong>que</strong>mas piagetianos — a maioria deles prejudicada.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!