19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

anco — penso nas enfermeiras. Vejo o estetoscópio —<br />

penso n<strong>um</strong> m<strong>é</strong>dico.”<br />

”Não me olha inteiro?”<br />

”Não, não o olho inteiro.”<br />

”Você percebe a diferença entre <strong>um</strong> padre, <strong>um</strong>a<br />

enfermeira, <strong>um</strong> m<strong>é</strong>dico?”<br />

”Eu sei qual <strong>é</strong> a diferença, mas ela nada significa<br />

para mim. Padre, enfermeira, m<strong>é</strong>dico — <strong>que</strong> importa?”<br />

136<br />

Dali por diante, para provocar, ela passou a dizer:<br />

”Sim, padre-enfermeira. Sim, enfermeira-<strong>do</strong>utor”, e<br />

outras combinações.<br />

Testar a discriminação entre es<strong>que</strong>rda e direita era<br />

singularmente difícil, pois ela dizia es<strong>que</strong>rda ou direita<br />

indistintamente (embora nas reações não houvesse<br />

confusão alg<strong>um</strong>a entre as duas, como ocorre quan<strong>do</strong><br />

existe <strong>um</strong> defeito de percepção ou atenção em <strong>um</strong> <strong>do</strong>s<br />

la<strong>do</strong>s). Quan<strong>do</strong> lhe chamei a atenção para isso, ela<br />

replicou: ”Es<strong>que</strong>rda/direita, direita/es<strong>que</strong>rda. Por <strong>que</strong><br />

tanto barulho? Qual a diferença?”.<br />

’’Existe <strong>um</strong>a diferença?”, perguntei”.<br />

”Obviamente”, respondeu ela com a precisão de <strong>um</strong>a<br />

química profissional. ”Poderíamos chamá-las<br />

enantiomorfas <strong>um</strong>a da outra. Mas nada significam para<br />

mim. Não são diferentes para mim. Mãos... m<strong>é</strong>dicos...<br />

enfermeiras...”, ela acrescentou, perceben<strong>do</strong> minha<br />

perplexidade. ”Não compreende? Não significam nada<br />

— nada para mim. Nada significa coisa alg<strong>um</strong>a... pelo<br />

menos para mim.”<br />

”E... esse nada significar...”, hesitei, recean<strong>do</strong><br />

prosseguir. ”Essa falta de senti<strong>do</strong>... isso a incomoda?<br />

Isso significa alg<strong>um</strong>a coisa para você?”<br />

”Absolutamente nada”, disse ela prontamente, com<br />

<strong>um</strong> sorriso largo, no tom de <strong>que</strong>m conta <strong>um</strong>a piada,<br />

ganha <strong>um</strong>a discussão, vence no pô<strong>que</strong>r.<br />

Seria negação? Seria <strong>um</strong>a ostentação de bravura?<br />

Seria o ”disfarce” de alg<strong>um</strong>a emoção intolerável? Seu<br />

rosto não mostrava sinal alg<strong>um</strong> de <strong>um</strong>a expressão mais

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!