19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

por<strong>que</strong> a Bíblia seja simples (pode-se afirmar o<br />

contrário), mas por<strong>que</strong> ela <strong>é</strong> apresentada de maneira<br />

simbólica e narrativa.<br />

E nesse aspecto Rebecca, aos dezenove anos, ainda<br />

era, como dissera sua avó, ”igualzinha a <strong>um</strong>a criança”.<br />

Igual a <strong>um</strong>a criança, mas não <strong>um</strong>a criança, pois ela era<br />

adulta. (O termo ”retarda<strong>do</strong>” sugere <strong>um</strong>a criança<br />

permanente, o termo ”deficiente mental”, <strong>um</strong> adulto<br />

deficiente; ambos os termos, ambos os conceitos, têm<br />

muito de verdade e muito de falsidade).<br />

Em Rebecca - e em outros deficientes a <strong>que</strong>m se<br />

permite ou se incentiva <strong>um</strong> desenvolvimento pessoal —<br />

as capacidades emocionais, narrativas e simbólicas<br />

podem desenvolver-se fortes e exuberantes, e podem<br />

produzir (como em Rebecca) <strong>um</strong>a esp<strong>é</strong>cie de poeta<br />

instintivo, ou (como em Jos<strong>é</strong>) <strong>um</strong>a esp<strong>é</strong>cie de artista<br />

instintivo, enquanto as capacidades paradigmáticas ou<br />

conceituais, manifestamente fracas desde o princípio,<br />

progridem com demasiada lentidão e dificuldade, sen<strong>do</strong><br />

capazes tão-somente de <strong>um</strong> desenvolvimento muito<br />

limita<strong>do</strong> e tolhi<strong>do</strong>.<br />

Rebecca percebia isso perfeitamente, como me<br />

demonstrou com grande clareza logo no primeiro dia<br />

em <strong>que</strong> a vi, quan<strong>do</strong> falou sobre sua falta de jeito e<br />

mencionou <strong>que</strong> seus movimentos desarmônicos e<br />

desorganiza<strong>do</strong>s tornavam-se bem organiza<strong>do</strong>s,<br />

harmônicos e fluentes com a música, e quan<strong>do</strong> me<br />

mostrou o quanto ela<br />

205<br />

própria adquiria harmonia graças a <strong>um</strong> cenário natural,<br />

<strong>um</strong> cenário com unidade e senti<strong>do</strong> orgânico, est<strong>é</strong>tico e<br />

dramático.<br />

De <strong>um</strong> mo<strong>do</strong> muito súbito, depois da morte da avó,<br />

ela foi clara e decidida: ”Não <strong>que</strong>ro mais aulas, nem<br />

workshops”, declarou. ”Eles não me ajudam em nada.<br />

Não fazem nada para me dar coerência.” E então, com<br />

a<strong>que</strong>le talento para o modelo ou metáfora apropria<strong>do</strong>s<br />

<strong>que</strong> eu tanto admirava e <strong>que</strong> se desenvolvera nela tão

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!