19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

at<strong>é</strong> mesmo geom<strong>é</strong>tricas e cubistas. Por fim, nas últimas<br />

pinturas, as telas eram absurdas, ou absurdas para<br />

mim: meras linhas caóticas e manchas de tinta.<br />

Comentei isso com a Srª. P.<br />

”Ora, vocês m<strong>é</strong>dicos são uns filisteus!”, ela<br />

exclamou. ”Não consegue ver o desenvolvimento<br />

artístico — como ele renunciou ao realismo de sua<br />

juventude e avançou para a arte abstrata, não<br />

representativa”?<br />

”Não, não <strong>é</strong> isso”, eu disse a mim mesmo (mas evitei<br />

mencioná-lo à pobre Srª. P.). Ele de fato passara <strong>do</strong><br />

realismo à não-representação e ao abstrato, por<strong>é</strong>m não<br />

se tratava <strong>do</strong> avanço <strong>do</strong> artista, e sim da patologia —<br />

avanço em direção à profunda agnosia visual, na qual<br />

todas as capacidades de representação e imaginação,<br />

to<strong>do</strong> o senso <strong>do</strong> concreto, to<strong>do</strong> o senso da realidade<br />

estavam sen<strong>do</strong> destruí<strong>do</strong>s.<br />

32<br />

A<strong>que</strong>la parede de quadros era <strong>um</strong>a trágica exposição<br />

patológica, <strong>que</strong> pertencia à neurologia e não à arte.<br />

E, contu<strong>do</strong>, refleti, ela não estaria em parte correta?<br />

Pois com freqüência existe <strong>um</strong>a luta, e, por vezes, o<br />

<strong>que</strong> <strong>é</strong> at<strong>é</strong> mais interessante, <strong>um</strong>a combinação entre os<br />

poderes da patologia e os da criação. Talvez, no perío<strong>do</strong><br />

cubista <strong>do</strong> dr. P, tenha havi<strong>do</strong> o desenvolvimento<br />

artístico tanto quanto o patológico, combinan<strong>do</strong>-se<br />

para engendrar <strong>um</strong>a forma original; pois, à medida <strong>que</strong><br />

ele foi perden<strong>do</strong> o concreto, talvez tamb<strong>é</strong>m tivesse<br />

ganho o abstrato, desenvolven<strong>do</strong> <strong>um</strong>a sensibilidade<br />

maior para to<strong>do</strong>s os elementos estruturais de linhas,<br />

limites, contornos — <strong>um</strong> poder quase como o de Picasso<br />

para ver, e igualmente representar, as organizações<br />

abstratas embutidas, e normalmente perdidas, no<br />

concreto. Embora eu receasse <strong>que</strong> nas últimas pinturas<br />

houvesse apenas casos de agnosia.<br />

Voltamos à grande sala de música, como Bõsen<strong>do</strong>rfer<br />

no centro e o dr. P. cantarolan<strong>do</strong> a última torta.<br />

”Bem, <strong>do</strong>utor <strong>Sacks</strong>”, disse ele, ”o senhor me julga

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!