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Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

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Não fui chama<strong>do</strong> novamente para ver Jos<strong>é</strong>. O<br />

primeiro chama<strong>do</strong>, n<strong>um</strong> <strong>do</strong>mingo à noite, fora para <strong>um</strong>a<br />

emergência. Ele vinha ten<strong>do</strong> ata<strong>que</strong>s ao longo de to<strong>do</strong> o<br />

fim de semana, e à tarde, por telefone, eu prescrevera<br />

alterações em seus anticonvulsivos. Agora <strong>que</strong> os<br />

238<br />

ata<strong>que</strong>s estavam ”controla<strong>do</strong>s”, não me solicitavam<br />

mais orientações neurológicas. Mas eu continuava<br />

perturba<strong>do</strong> pelos problemas origina<strong>do</strong>s pelo relógio,<br />

com <strong>um</strong>a sensação de mist<strong>é</strong>rio não soluciona<strong>do</strong> me<br />

perseguin<strong>do</strong>. Eu precisava revê-lo. Assim, mar<strong>que</strong>i <strong>um</strong>a<br />

nova visita e providenciei para <strong>que</strong> me mandassem<br />

toda a sua ficha — na vez anterior tinham me da<strong>do</strong><br />

apenas <strong>um</strong>a papeleta de consulta, pouco informativa.<br />

Jos<strong>é</strong> entrou indiferente no consultório—não tinha<br />

id<strong>é</strong>ia da razão por <strong>que</strong> fora chama<strong>do</strong> (e talvez não se<br />

importasse) —, mas seu rosto il<strong>um</strong>inou-se com <strong>um</strong><br />

sorriso quan<strong>do</strong> ele me viu. O semblante apático,<br />

indiferente, a máscara de <strong>que</strong> eu me lembrava, foi<br />

tirada. Houve <strong>um</strong> sorriso repentino, tími<strong>do</strong>, como <strong>um</strong>a<br />

olhadela por <strong>um</strong>a porta.<br />

”Andei pensan<strong>do</strong> em você, Jos<strong>é</strong>”, falei. Ele podia não<br />

entender minhas palavras, mas compreendia meu tom.<br />

”Quero ver mais desenhos” — e dei a ele minha caneta.<br />

O <strong>que</strong> eu deveria pedir a ele para desenhar dessa<br />

vez? Eu tinha ali, como sempre, <strong>um</strong>a cópia de Arizona<br />

Highways, <strong>um</strong>a revista ricamente ilustrada <strong>que</strong> eu<br />

especialmente apreciava e <strong>que</strong> sempre trazia comigo<br />

com objetivos neurológicos, para testar meus<br />

pacientes. A capa mostrava <strong>um</strong>a cena idílica de pessoas<br />

passean<strong>do</strong> de<br />

239<br />

canoa em <strong>um</strong> lago, ao pôr-<strong>do</strong>-sol, com montanhas ao<br />

fun<strong>do</strong>. Jos<strong>é</strong> começou com o primeiro plano, <strong>um</strong>a massa<br />

quase negra em silhueta contra a água, esboçou-a com<br />

extrema precisão e começou a encher o desenho. Mas<br />

isso claramente era trabalho para <strong>um</strong> paintbrush, não<br />

para <strong>um</strong>a caneta. ”Deixe isso de la<strong>do</strong>”, falei, e apontei,

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