19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

próprio. Reuni <strong>um</strong>a pilha delas e, meio apreensivo,<br />

mostrei-as ao dr. P. O <strong>que</strong> fora engraça<strong>do</strong> ou grotesco<br />

com relação ao filme revelou-se trágico com relação à<br />

sua vida. De <strong>um</strong> mo<strong>do</strong> geral, ele não reconheceu pessoa<br />

alg<strong>um</strong>a: nem parentes, nem colegas, nem alunos, nem<br />

a si próprio. Reconheceu <strong>um</strong> retrato de Einstein por<strong>que</strong><br />

percebeu o cabelo e o bigode característicos, e o<br />

mesmo aconteceu com <strong>um</strong>a ou duas outras pessoas.<br />

”Ah, Paul!”, disse ele ao ver <strong>um</strong> retrato <strong>do</strong> irmão. ”Esse<br />

<strong>que</strong>ixo quadra<strong>do</strong>, esses dentões-eu reconheceria Paul<br />

em qual<strong>que</strong>r lugar!” Mas era Paul <strong>que</strong> ele reconhecia ou<br />

<strong>um</strong>a ou duas de suas características, com base nas<br />

quais ele conseguia fazer <strong>um</strong>a boa suposição quanto à<br />

identidade <strong>do</strong> sujeito? Na ausência de ”marca<strong>do</strong>res”<br />

óbvios, ele se perdia por completo. Mas não era apenas<br />

<strong>um</strong>a deficiência da cognição, da gnose; havia alg<strong>um</strong>a<br />

coisa radicalmente errada em to<strong>do</strong> o mo<strong>do</strong> como ele<br />

procedia. Pois ele lidava com a<strong>que</strong>les rostos — mesmo<br />

os das pessoas mais chegadas — como se fossem<br />

<strong>que</strong>bra-cabeças ou testes abstratos. Não se relacionava<br />

com eles, não os contemplava. Nenh<strong>um</strong> rosto lhe era<br />

familiar, visto como <strong>um</strong> ”você”; era apenas identifica<strong>do</strong><br />

como <strong>um</strong> conjunto de características, <strong>um</strong>a ”coisa”.<br />

Assim, havia gnose formal, mas nenh<strong>um</strong> traço de gnose<br />

pessoal. E isso vinha acompanha<strong>do</strong> de sua indiferença,<br />

ou cegueira, para as expressões. Um rosto, para nós, <strong>é</strong><br />

<strong>um</strong>a pessoa olhan<strong>do</strong> para fora — vemos, por assim<br />

dizer, a pessoa por interm<strong>é</strong>dio de sua persona, de seu<br />

rosto. Mas para o dr. P. não havia persona neste<br />

senti<strong>do</strong> — nenh<strong>um</strong>a persona exterior, e nenh<strong>um</strong>a<br />

pessoa interior.<br />

No caminho para o apartamento <strong>do</strong> dr. P, eu havia<br />

entra<strong>do</strong> em <strong>um</strong>a floricultura e compra<strong>do</strong> <strong>um</strong>a vistosa<br />

rosa vermelha para pôr na lapela. Tirei-a dali e a passei<br />

para o dr. P. Ele a pegou como <strong>um</strong> botânico ou<br />

morfologista pegaria <strong>um</strong> esp<strong>é</strong>cime, e não como algu<strong>é</strong>m<br />

<strong>que</strong> recebe <strong>um</strong>a flor.<br />

”Uns quinze centímetros de comprimento”,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!