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Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

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quase milagrosa anamnese <strong>que</strong> abrira à força a porta<br />

fechada da amn<strong>é</strong>sia da infância, foi proporcionada,<br />

para<strong>do</strong>xalmente, por <strong>um</strong> distúrbio cerebral.<br />

Ao contrário da sra. O’M., para <strong>que</strong>m os ata<strong>que</strong>s<br />

eram exaustivos e tediosos, a sra. O’C. obtinha deles<br />

<strong>um</strong> conforto para o espírito. Eles lhe davam <strong>um</strong> senso<br />

de sustentáculo psicológico e realidade, o senso<br />

elementar <strong>que</strong> ela perdera, nas longas d<strong>é</strong>cadas de<br />

desligamento e ”exílio”, de <strong>que</strong> ela tivera <strong>um</strong>a<br />

verdadeira infância e <strong>um</strong> lar, de <strong>que</strong> fora amada e<br />

recebera cuida<strong>do</strong>s e carinho materno. Enquanto a sra.<br />

O’M. <strong>que</strong>ria o tratamento, a sra. O’C. recusava os<br />

anticonvulsivos: ”Eu preciso destas lembranças”, dizia.<br />

”Preciso <strong>do</strong> <strong>que</strong> está acontecen<strong>do</strong>... E isto vai terminar<br />

mais ce<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>que</strong> eu gostaria”.<br />

163<br />

Dostoievski tinha ”ata<strong>que</strong>s psíquicos” ou ”esta<strong>do</strong>s<br />

mentais complexos” no início <strong>do</strong>s ata<strong>que</strong>s epil<strong>é</strong>pticos, e<br />

certa vez comentou sobre eles:<br />

Vocês, pessoas sadias, não podem imaginar a felicidade<br />

<strong>que</strong> nós, epil<strong>é</strong>pticos, sentimos durante o segun<strong>do</strong> <strong>que</strong><br />

antecede nossos ata<strong>que</strong>s [...] Não sei se essa felicidade<br />

dura segun<strong>do</strong>s, horas ou meses, mas, acreditem, eu<br />

não a trocaria por todas as alegrias <strong>que</strong> a vida pode<br />

proporcionar. (T. Alajouanine, 1963.)<br />

A sra. O’C. deve ter compreendi<strong>do</strong> isso. Tamb<strong>é</strong>m ela<br />

sentia, em seus ata<strong>que</strong>s, <strong>um</strong>a extraordinária felicidade.<br />

Mas isso lhe parecia o auge da sanidade mental e da<br />

saúde — a própria chave, ou melhor, a porta, para a<br />

sanidade mental e a saúde. Por isso, vivenciava sua<br />

<strong>do</strong>ença como saúde, como <strong>um</strong>a cura.<br />

Quan<strong>do</strong> melhorou e por fim se recobrou <strong>do</strong> derrame,<br />

a sra. O’ C. atravessou <strong>um</strong> perío<strong>do</strong> de melancolia e<br />

me<strong>do</strong>. ”A porta está fechan<strong>do</strong>”, ela comentou. ”Estou<br />

perden<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> novamente”. E de fato ela perdeu, em<br />

mea<strong>do</strong>s de abril, as súbitas irrupções de cenas, músicas

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