19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>um</strong>a pausa: ”Vovó está bem. Ela foi para sua casa<br />

eterna”. Casa eterna! Seria esse <strong>um</strong> símbolo dela<br />

própria ou <strong>um</strong>a lembrança inconsciente <strong>do</strong> Eclesiastes,<br />

ou <strong>um</strong>a alusão a este? ”Estou com tanto frio”, <strong>que</strong>ixouse,<br />

encolhen<strong>do</strong>-se toda. ”Não <strong>é</strong> lá fora, <strong>é</strong> inverno aqui<br />

dentro. Frio como a morte”, ela acrescentou. ”Ela era<br />

parte de mim. Uma parte de mim morreu com ela”.<br />

203<br />

Ela era completa em seu luto — trágica e completa ,<br />

na<strong>que</strong>le momento não havia absolutamente a sensação<br />

de ela ser <strong>um</strong>a ”deficiente mental”. Passada meia hora,<br />

ela degelou, recobrou <strong>um</strong> pouco de sua vivacidade e<br />

animação, comentou: ”É inverno. Eu me sinto morta.<br />

Mas sei <strong>que</strong> a primavera virá de novo”.<br />

A superação <strong>do</strong> pesar foi lenta, mas bem-sucedida,<br />

como Rebecca, mesmo nas piores horas, havia previsto.<br />

Nisso foi de grande ajuda <strong>um</strong>a tia-avó <strong>que</strong> a<br />

compreendeu e apoiou, <strong>um</strong>a irmã da avó de Rebecca<br />

<strong>que</strong> foi morar com ela. Muito contribuíram tamb<strong>é</strong>m a<br />

sinagoga e a comunidade religiosa, sobretu<strong>do</strong> os ritos<br />

<strong>do</strong> shiva e o status especial conferi<strong>do</strong> a ela por ter si<strong>do</strong><br />

<strong>que</strong>m mais sofreu com a perda, a principal enlutada.<br />

Tamb<strong>é</strong>m foi muito útil, talvez, o fato de ela falar<br />

livremente comigo. E al<strong>é</strong>m disso, curiosamente, <strong>um</strong>a<br />

grande ajuda veio de seus sonhos, os quais ela relatou<br />

com animação e claramente marcaram estágios na<br />

superação <strong>do</strong> pesar (ver Peters, 1983).<br />

Assim como me recor<strong>do</strong> dela como Nina ao sol de<br />

abril, tamb<strong>é</strong>m me lembro dela, esboçada com trágica<br />

nitidez, no escuro novembro da<strong>que</strong>le ano, em p<strong>é</strong> n<strong>um</strong><br />

desola<strong>do</strong> cemit<strong>é</strong>rio de Queens, recitan<strong>do</strong> o Kaddish<br />

diante da sepultura da avó. As preces e histórias<br />

bíblicas sempre lhe haviam desperta<strong>do</strong> o interesse,<br />

atenden<strong>do</strong> ao la<strong>do</strong> alegre, ”abençoante” de sua vida.<br />

Agora, nas preces <strong>do</strong> funeral, no salmo 103 e,<br />

sobretu<strong>do</strong> no Kaddish, ela encontrou as únicas palavras<br />

certas para lhe trazer consolo e expressar sua tristeza.<br />

Nos meses decorri<strong>do</strong>s entre a primeira vez em <strong>que</strong> a

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!