19.04.2013 Views

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

experiência bizarra. Eu havia tira<strong>do</strong> seu sapato <strong>do</strong> p<strong>é</strong><br />

24<br />

es<strong>que</strong>r<strong>do</strong> e arranha<strong>do</strong> a sola <strong>do</strong> p<strong>é</strong> com <strong>um</strong>a chave —<br />

<strong>um</strong> teste de reflexo aparentemente frívolo, por<strong>é</strong>m<br />

essencial — e em seguida, pedin<strong>do</strong> licença para<br />

parafusar o oftalmoscópio, deixei-o sozinho para <strong>que</strong><br />

ele calçasse o sapato. Para minha surpresa, <strong>um</strong> minuto<br />

depois ele não o calçara.<br />

”Posso ajudar?”, perguntei.<br />

”A fazer o quê? Ajudar <strong>que</strong>m?”<br />

”Ajudá-lo a calçar o sapato.”<br />

”É mesmo, eu tinha es<strong>que</strong>ci<strong>do</strong> o sapato”, disse ele,<br />

acrescentan<strong>do</strong> sotto você ”O sapato? O sapato?”. Ele<br />

parecia desconcerta<strong>do</strong>.<br />

”Seu sapato”, repeti. ”Talvez <strong>que</strong>ira calçá-lo”.<br />

Ele continuou a olhar para baixo, embora não para o<br />

sapato, com <strong>um</strong>a concentração intensa mas mal<br />

dirigida. Por fim seu olhar parou sobre seu p<strong>é</strong>. ”Esse <strong>é</strong><br />

meu sapato, não?”<br />

Eu teria ouvi<strong>do</strong> mal? Ele teria visto mal?<br />

”Meus olhos”, ele explicou, levan<strong>do</strong> a mão ao p<strong>é</strong>.<br />

”Este <strong>é</strong> meu sapato, não <strong>é</strong>?”<br />

”Não, não <strong>é</strong>. Esse <strong>é</strong> seu p<strong>é</strong>. O sapato está ali”.<br />

”Ah! pensei <strong>que</strong> a<strong>que</strong>le fosse meu p<strong>é</strong>”.<br />

Ele estaria brincan<strong>do</strong>? Estaria louco? Estaria cego?<br />

Se a<strong>que</strong>le era <strong>um</strong> de seus ”erros estranhos”, então era<br />

o erro mais estranho <strong>que</strong> eu já vira.<br />

Ajudei-o a calçar o sapato (seu p<strong>é</strong>) para evitar mais<br />

complicações. O dr. P. parecia despreocupa<strong>do</strong>,<br />

indiferente, talvez estivesse achan<strong>do</strong> graça. Voltei a<br />

meu exame. Sua acuidade visual era boa: ele não tinha<br />

dificuldade para enxergar <strong>um</strong> alfinete no chão, embora<br />

às vezes não o visse quan<strong>do</strong> era posto à sua es<strong>que</strong>rda.<br />

Ele enxergava bem, mas o <strong>que</strong> via? Abri <strong>um</strong>a revista<br />

National Geographic e lhe pedi <strong>que</strong> descrevesse<br />

alg<strong>um</strong>as ilustrações.<br />

Suas respostas foram muito curiosas. Seus olhos<br />

dardejavam de <strong>um</strong>a coisa para outra, captan<strong>do</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!