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Orelha do livro Oliver Sacks é um neurologista que reivindica ... - Stoa

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consegue desenhá-lo de novo?” Ele assentiu<br />

avidamente com a cabeça e tirou a caneta de minha<br />

mão Fazia três semanas <strong>que</strong> ele vira o peixe O <strong>que</strong> iria<br />

desenhar agora?<br />

Ele fechou os olhos por <strong>um</strong> momento — convocan<strong>do</strong><br />

<strong>um</strong>a imagem? — e depois desenhou Ainda era <strong>um</strong>a<br />

truta, com manchas nas cores <strong>do</strong> arco-íris, barbatanas<br />

franjadas e cauda fendida, mas dessa vez com<br />

características flagrantemente h<strong>um</strong>anas, <strong>um</strong>a narina<br />

singular (<strong>que</strong> peixe tem narinas?) e <strong>um</strong> par de lábios<br />

definitivamente h<strong>um</strong>anos Eu já ia pegar a caneta, mas<br />

ele não terminara O <strong>que</strong> teria em mente? A imagem<br />

estava completa A imagem talvez, mas não a cena O<br />

peixe de antes existira — como <strong>um</strong> ícone — em<br />

isolamento, agora ele se tornaria parte de <strong>um</strong> mun<strong>do</strong>,<br />

de <strong>um</strong>a cena com rapidez, Jos<strong>é</strong> esboçou <strong>um</strong> peixinho,<br />

<strong>um</strong> companheiro, mergulhan<strong>do</strong> em pirueta na água,<br />

obviamente brincan<strong>do</strong> A seguir, ele esboçou a<br />

superfície da água, erguen<strong>do</strong>-se n<strong>um</strong>a onda súbita,<br />

t<strong>um</strong>ultuosa. Ao<br />

246<br />

desenhar a onda ele se excitou, emitin<strong>do</strong> <strong>um</strong> grito<br />

estranho, misterioso.<br />

Não pude evitar a impressão, talvez cômoda, de <strong>que</strong><br />

a<strong>que</strong>le desenho era simbólico — o peixe pe<strong>que</strong>no e o<br />

peixe grande, talvez ele e eu? Mas o <strong>que</strong> era muito<br />

interessante e instigante era a representação<br />

espontânea, o impulso, não sugestão minha, mas<br />

partin<strong>do</strong> totalmente dele, para introduzir esse novo<br />

elemento — <strong>um</strong>a interação viva no <strong>que</strong> ele desenhara.<br />

Em seus desenhos, como em sua vida, at<strong>é</strong> então, a<br />

interação sempre estivera ausente. Agora, mesmo <strong>que</strong><br />

apenas de brincadeira, em símbolos, era-lhe permiti<strong>do</strong><br />

voltar. Seria mesmo? O <strong>que</strong> seria a<strong>que</strong>la onda irada,<br />

vingativa?<br />

Melhor voltar para terreno seguro, pensei; chega de<br />

livre associação. Eu vira potencial, mas vira, e ouvira,<br />

perigo tamb<strong>é</strong>m. Voltemos à segura, edênica, virginal

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