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CRÍTICA DE CINEMA EM O TEMPO – 1954 - Bresser Pereira

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UM FILME <strong>DE</strong> COCTEAU<br />

12.03.54<br />

Foi exibido na semana passada, no cine Oásis, “Les parents terribles”,<br />

um filme que Cocteau realizou em 1948, dois anos antes de “Orfeu”. Não se<br />

situa essa película entre as melhores coisas realizadas pelo extraordinário<br />

criador de “A bela e a fera”, mas podemos distinguir nela a marca de sua<br />

personalidade incomum.<br />

“Les parents terribles”baseia-se em uma peça teatral homônima de sua<br />

autoria. Trata-se de uma obra profundamente intelectualizada, sofisticada<br />

mesmo bem ao estilo de Jean Cocteau, em que ele narra a história íntima de<br />

uma família pequeno-burguesa, cujos membros sofrem todos eles de algum<br />

desequilíbrio ou de algum complexo profundo. Resumem-se a cinco as<br />

personagens da peça: o pai, homem vulgar e inexpressivo, a mãe, dominada por<br />

um ciúmes doentio e por uma total insegurança ante a vida, o filho, um rapaz<br />

sentimental e tolo, a tia, solteirona vingativa e insensível, que, com rara<br />

inteligência, tenta provocar a infelicidade da irmã, e a amante do pai e do filho,<br />

que pretende casar-se com este último.<br />

Toda a peça tem um caráter essencialmente de análise dos tipos<br />

humanos que apresenta, dedicando especial atenção as duas irmãs de meia<br />

idade. Seu valor dramático é bastante discutível, dados os verdadeiros<br />

preciosismos de análise psicológica a que se entrega o seu autor, com prejuízo<br />

para a humanidade e conseqüentemente para a autenticidade do filme. Cocteau,<br />

ao escrever o roteiro e ao dirigir o filme, sentiu-se perfeitamente no seu elenco<br />

⎯ o da sofisticação e da poesia do irreal. Paradoxalmente, porém, se a peça<br />

pretendia ser sofisticada pretendia também ser realista e surgiu daí o choque<br />

que limitou muito o valor do filme. Isto, aliado ao seu caráter teatral, que<br />

Cocteau não conseguiu dominar, determinou o seu fracasso.<br />

Não queremos dizer com isso que Cocteau tenha realizado um mau<br />

filme. Unicamente esta sua realização não pode ser comparada com “A bela e a<br />

fera” ou “Orfeu”. Serviu, porém, para reafirmar a necessidade que tem o<br />

cinema, principalmente quando tem diante de si argumento baseado no diálogo,<br />

de usar dos recursos da montagem. O que tem distinguido Jean Cocteau como<br />

diretor, além de seu gosto pela irrealidade, pelo sobrenatural e de suas<br />

tentativas, que se podem dizer bem sucedidas, de fundir a poesia literária com o<br />

cinema, é uma absoluta originalidade ao realizar suas enquadrações. Em todos<br />

os seus filmes, inclusive em “Les parents terribles”, ele tem conseguido<br />

resultados excelentes, graças a uma enquadração essencialmente funcional e

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