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A luta do CEBES - Faculdade de Saúde Ibituruna - FASI

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A instituição psiquiátrica <strong>de</strong>veria ser então negada, enquanto saber e po<strong>de</strong>r. Numaatitu<strong>de</strong> autenticamente husserliana, Basaglia propõe inverter esta estratégia, isto é,colocar a <strong>do</strong>ença mental entre parênteses, para po<strong>de</strong>r lidar e perceber o sujeito em suaexperiência-sofrimento 38 . Basaglia enten<strong>de</strong> que “a objetivação <strong>do</strong> homem em síndromes(...) tem ti<strong>do</strong> conseqüências extremamente irreversíveis no <strong>do</strong>ente que - originalmenteobjetiva<strong>do</strong> e restrito aos limites da <strong>do</strong>ença - fôra confirma<strong>do</strong> como categoria fora <strong>do</strong>humano por uma ciência que <strong>de</strong>veria distanciar-se e excluir aquilo que não estava emgrau <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r” 39 .O colocar a <strong>do</strong>ença mental entre parênteses não é, portanto, a negação da loucuraou <strong>do</strong> sofrimento, mas um procedimento epistemológico <strong>de</strong> suspen<strong>de</strong>r o conceito <strong>de</strong><strong>do</strong>ença mental enquanto saber produzi<strong>do</strong> pela psiquiatria. Assim, a <strong>do</strong>ença mental entreparênteses é, a um só tempo, a ruptura com o saber psiquiátrico enquanto obstáculoepistemológico, e a condição <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma outra relação da socieda<strong>de</strong> paracom os sujeitos porta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> sofrimento.Sob o diagnóstico <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença mental to<strong>do</strong>s os sujeitos tornam-se iguais, e ainstitucionalização mesma contribui para constituir os próprios estereótipos e trejeitosque serão soma<strong>do</strong>s ao rol <strong>do</strong>s sinais e sintomas. Desconstruir o saber psiquiátrico e omanicômio significa então estabelecer uma relação que não passe primariamente pelodiagnóstico, pelo sintoma ou pela <strong>do</strong>ença. É <strong>de</strong>sta forma que, inspira<strong>do</strong> num texto <strong>de</strong>Artaud 40 , Basaglia <strong>de</strong>senvolve a noção <strong>de</strong> duplo da <strong>do</strong>ença mental, enquanto o conjunto<strong>de</strong> incrustações institucionais, sociais e culturais que são impregnadas aos sujeitosobjetiva<strong>do</strong>s pelo saber e práticas psiquiátricas.A <strong>de</strong>sinstitucionalização surge então como uma estratégia <strong>de</strong> negação da psiquiatriaenquanto i<strong>de</strong>ologia realizada na prática, isto é, na <strong>de</strong>smontagem <strong>do</strong>s aparatosjurídicos, conceituais e sócio-culturais que se edificaram sobre a noção <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença mental.As práticas sociais e culturais para com a loucura tornada <strong>do</strong>ença mental mantém umarelação <strong>de</strong> estreita inter<strong>de</strong>pendência com o saber da medicina mental: Foucault<strong>de</strong>monstra, por exemplo, como a percepção médica incorporou elementos da percepçãosocial para constituir o conceito <strong>de</strong> alienação mental, num primeiro momento, e <strong>de</strong> <strong>do</strong>ençamental, logo após. E, uma vez constituída a psiquiatria enquanto ciência, é esta ainfluenciar o imaginário social quanto ao que vem a ser o louco, o <strong>do</strong>i<strong>do</strong>, o <strong>do</strong>ente, aloucura, a <strong>do</strong>ença mental. Dan<strong>do</strong> continuida<strong>de</strong>, Basaglia parte <strong>do</strong> pressuposto <strong>de</strong> que apsiquiatria <strong>de</strong>veria exercitar uma nova prática para com a loucura e, assim, produzirum novo imaginário social.Após a morte <strong>de</strong> Basaglia, em agosto <strong>de</strong> 1980, o MTSM distanciou-se <strong>de</strong> suasidéias mais fundamentais e viu-se envolvi<strong>do</strong>, a partir da estratégia da ocupação <strong>de</strong>espaços nos centros <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão das políticas públicas, com <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>sprincípios que aproximavam a noção <strong>de</strong> <strong>de</strong>sinstitucionalização daquela <strong>de</strong><strong>de</strong>sospitalização. De uma forma geral, o mesmo aconteceu em outros países, quan<strong>do</strong> aexperiência basagliana per<strong>de</strong>u o interesse que teve originalmente, fortemente associadaao movimento contra-cultural <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 68. Contu<strong>do</strong>, sob a condução <strong>de</strong> Franco Rotelli,38. Trata-se da noção <strong>de</strong> épochè ou redução fenomenológica <strong>de</strong> Edmund Husserl.39. Basaglia, Franco e Basaglia, Franca Ongaro. Un problema di psichiatria istituzionale (dalla vitaistituzionale alla vita di comunità). In: Basaglia scritti I (F.O. Basaglia, 1981, org.), 309-328. Torino: Einaudi,pp. 309-310.40. Trata-se <strong>de</strong> O teatro e seu duplo <strong>de</strong> Antonin Artaud.180 SAÚDE E DEMOCRACIA - A LUTA DO <strong>CEBES</strong>

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