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A luta do CEBES - Faculdade de Saúde Ibituruna - FASI

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Michel Foucault, por exemplo, relata que, para alguns revolucionários <strong>de</strong> 1789, as <strong>do</strong>ençasnão eram mais <strong>do</strong> que conseqüências das condições <strong>de</strong> existência e das formas <strong>de</strong> vida<strong>do</strong>s indivíduos, sujeitas a influências <strong>de</strong> épocas e lugares. Por isso, a primeira tarefa <strong>do</strong>médico é política e sua <strong>luta</strong> é contra os maus governos: “Quem, portanto, <strong>de</strong>verá<strong>de</strong>nunciar os tiranos ao gênero humano senão os médicos, que fazem <strong>do</strong> homem seuúnico estu<strong>do</strong> e que to<strong>do</strong>s os dias, em casa <strong>do</strong> cidadão e <strong>do</strong> mais po<strong>de</strong>roso, sob umachoça ou moradas suntuosas, contemplam a miséria humana que não têm outra origema não ser a tirania e a escravidão?” 5 .Se <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rarmos o evi<strong>de</strong>nte entusiasmo <strong>de</strong> uma tal assertiva, po<strong>de</strong>mos aíi<strong>de</strong>ntificar condições necessárias, ainda que não suficientes, <strong>do</strong>s sofrimentos humanos.A tirania é, sem dúvida, o oposto da liberda<strong>de</strong>. A privação representa, sem dúvida,obstáculos a uma plenitu<strong>de</strong>. Sua eliminação significa a eliminação <strong>de</strong> toda e qualquer<strong>do</strong>r, <strong>do</strong>s sofrimentos, da <strong>de</strong>cadência e, por extensão, da <strong>do</strong>ença e da morte? Obviamentenão. Claramente, porém, representa uma sua atenuação.Thomas McKeown tem si<strong>do</strong>, recorrentemente, solicita<strong>do</strong> a testemunhar.Constituem-se seus estu<strong>do</strong>s em mais uma <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> mudanças em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>spadrões e perfis po<strong>de</strong>m ocorrer em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> medidas gerais que, portanto, nãovisam aspectos específicos das situações retratadas. As taxas <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> portuberculose, por ele levantadas na Inglaterra e Gales <strong>de</strong> 1838 a 1970, é um exemplo <strong>do</strong>smais expressivos. Antes mesmo que o bacilo <strong>de</strong> Koch fosse i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> pelos i<strong>do</strong>s <strong>de</strong> 80<strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>, a taxa <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> específica por tuberculose caiu pela meta<strong>de</strong>.Antes <strong>do</strong> advento da quimioterapia e <strong>do</strong> BCG, <strong>de</strong>clínio semelhante se verificou. Susser,recentemente, relembrou conclusões daquele autor: a melhora se <strong>de</strong>ve, não ao que nosacontece quan<strong>do</strong> estamos <strong>do</strong>entes, mas ao fato que estamos menos freqüentemente<strong>do</strong>entes, e permanecemos bem, não por causa <strong>de</strong> medidas específicas, mas porqueusufruímos <strong>de</strong> um alto nível nutricional e <strong>de</strong> vida, em um ambiente saudável 6 .1838 não é uma data aleatória. A “revolução industrial” torna extemporânea, naInglaterra, a “antiga Lei <strong>do</strong>s Pobres”, essencialmente por restringir a mobilida<strong>de</strong> daforça <strong>de</strong> trabalho, legalmente presa à terra. Sua reformulação se dá sob a li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong>Chadwick em 1834. A nova “lei <strong>do</strong>s pobres” significa, no essencial, a liberação da “força<strong>de</strong> trabalho” para aten<strong>de</strong>r à nova forma <strong>de</strong> produzir, concentrada em um também novotipo <strong>de</strong> espaço urbano. As conseqüências, to<strong>do</strong>s sabemos, inclusive através <strong>de</strong> Engels,quan<strong>do</strong> nos <strong>de</strong>screve as condições das classes trabalha<strong>do</strong>ras naquele perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> consolidação<strong>do</strong> capitalismo na Inglaterra. Duas ameaças se apresentam: risco <strong>de</strong> que to<strong>do</strong>sos habitantes viessem a a<strong>do</strong>ecer e queda <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> na produção industrial. Aintervenção estatal vai se construin<strong>do</strong>, principalmente em relação ao saneamentoambiental, em que pese as teses liberais benthamianas esposadas por Chadwick. Amo<strong>de</strong>rna “saú<strong>de</strong> pública” vem a ser, então, uma política <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong> que, toman<strong>do</strong> comoobjeto as enfermida<strong>de</strong>s, intervém sobre o social visan<strong>do</strong> os interesses maiores <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>sda nova forma <strong>de</strong> produzir.Dominantes, tais interesses pressupõem a existência <strong>de</strong> outros, certamente<strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s. Se os primeiros querem eliminar as <strong>do</strong>enças visan<strong>do</strong> retirar o máximoresulta<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua forma <strong>de</strong> produzir, os segun<strong>do</strong>s vêem nesta forma mesma a raiz <strong>do</strong>5. Lanthenas, cita<strong>do</strong> por Foucault, M. El Nacimiento <strong>de</strong> la Clínica. Siglo Veintiuno Editores S.A. México,1966. pag.59.6. Susser, M. American Journal of Public Health. 83(3): 422,1993.SAÚDE E DEMOCRACIA - A LUTA DO <strong>CEBES</strong>209

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